16 agosto 2003

Um livro para Ana Paula Inácio

André Bonirre viajou por alguns sítios este verão. Não falarei mais da viagem aos Açores cujo principal, e único objectivo se gorou. Não inteiramente. As coisas acontecem sempre de uma forma diferente da que tínhamos pressentido. O José Mário assegura que a Ana Paula Inácio existe,” é encantadora, com um sorriso bonito, mas muito tímida. Parece prestes a desfazer-se no ar como se a única coisa que a prendesse à terra fossem as palavras (ou nem isso)” . Provavelmente não está agráfica. Simplesmente, dando provas de um bom senso que a outros terá faltado, não quis entregar originais a uma antologia que julgou sem critério, ou apenas geracional. Ou não quis ser envolvida na guerra do alecrim e da manjerona, nortistas contra sulistas, realistas contra simbolistas, discípulos de Sena e Belo contra herdeiros de Herberto Hélder. Seja como for, Ana Paula passa bem sem os conselhos de que André era portador, bem escassos por sinal. Se ela sorri, como diz o José Mário, então não se calou nela a vontade de escrever. Faço votos para que não esteja na ilha do Pico, pelo menos no Inverno. Foi a meio do Canal, na direcção da Madalena, que Tongoy, o feiíssimo alter ego do narrador vilamateano de O mal de Montano deixou soltar a frase - E não haverá no paraíso outra morte! Porque a Madalena geralmente deserta, a enganadora alacridade do mar em Cais do Pico, a extensão surpreendente da ilha na Calheta do Nesquim , são tão perigosos como alguns fins de dia, no verão, em que o sol incendeia atrás de nós o vulcão e a ilha de S. Jorge parece o sítio onde realmente devíamos estar. Assim encerro a minha procura de Ana Paula, um pouco triste, parcialmente vencido. De facto eu não esperava que uma escritora de escrita tímida e antiga, uma voz dada a gente subalterna, circulasse na blogosfera ou lesse os jornais da Penitenciária de Coimbra. Se André Bonirre tivesse estado com Ana Paula levava-lhe também alguns livros de Invisíveis, criaturas literárias que não quiseram dar nas vistas, passaram sem ruído, fizeram o seu trabalho, o humilde trabalho dos agricultores, dos funcionários. Não lhe levava Kafka, porque é seguro que API conhece o homem obscuro que Praga ignorou e agora comercializa. A conselho do narrador vilamateano, André conseguira, comdificuldade, obter um livro de Robert Walser, copista em Zurique- entre outras profissões servis, internado num sanatório, caminheiro, que numa tarde de 25 de Dezembro de 1956, teve um fim ao gosto de API. Caminhou longamente até se confundir com a brancura do chão.

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