31 dezembro 2003

Nem um sinal por ti

Vocês foram generosos para o Mal. Leram-nos, falaram connosco, falaram de nós. Alguns de vocês escreveram comentários, essa guerra que se perde sempre contra o ennetation. Mandaram-nos mails, sms, cartas, encomendas. Nós gostamos tanto de vocês.
Uma tarde de verão, no nosso mail, estava um recado do escritor de Barcelona que dedica os seus livros a Paula de Parma. Convalescente do mal de Montano, julguei merecer aquela distinção.
Só tu não vieste. Eu entendi o teu silêncio para o Inimigo Rumor. Esperei todos os dias da minha cela por um sinal teu. Em cidades várias, os meus amigos compraram os teus livros. Até o Humberto, tão reticente na adesão aos meus entusiasmos literários, te encomendou na livraria a que é fiel. Que os teus livros, raros, são mesmo de encomenda. O Verão passou sem que a minha irmã e o André Bonirre te encontrassem nos túneis do Pico, um dos sí­tios onde o alferes Maltë pergunta: então é aqui que se vive?
O meu amigo influente prometeu convidar-te para o Palácio, a pretexto de um acontecimento cultural. Mas até ele falhou nessa investidura. E o adido cultural, e o pediatra de Angra.
O tempo passou. Tu não escreveste mais. Não disseste sequer que estavas viva, um poeta mais desgraçadamente ágrafo, mas vivo. O Zé Mário, delicado: Talvez ela não queira ser encontrada. Eu percebi. Desde os quinze anos que aprendi a reconhecer as mulheres que não querem ser encontradas por gente como eu. Mas qualquer coisa em mim me dizia que quando te esquecesse, quando nem os nomes dos teus livros recordasse, nem um verso teu me queimasse os lábios, nem o teu nome me toldasse, esse seria o dia de um sinal teu, da tua suave epifania. Passaram os dias. E agora passam as últimas horas do último dia. E tu não vens, nem um sinal por ti, Ana Paula Inácio.

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