07 abril 2004

10. Livraria, diz: Ler Devagar

Gosto de encontrar os livros da & etc, logo ao lado da porta, e os da Antígona também. Gosto da idéia (não sei se gosto da Idéia). Das cadeiras, dos sofás e das mesas. Do horário de funcionamento. Os livros parecem-me desarrumados e o bar só funciona quando há amigos ou sessões especiais. Nesta livraria encontro pessoas que não via há algum tempo. Quase sempre fingimos não nos reconhecer. É assim que se aproveita bem o tempo numa livraria. Há lá umas senhoras que me lembram a minha tia Mercedes. Têm o ar severo de quem nos castiga se pecarmos. É possível que em situações que não consigo imaginar a severidade se atenue e um sorriso adoce aquela compostura. É possível. A minha tia Mercedes sorria em ocasiões memoráveis. Mas nunca vi sorrir as senhoras. Também há lá um rapazola, cheio de ombros, que um dia destes se virou para mim e me disse: "Estamos fechados". A porta estava aberta, eu folheava um livro do Carlos Bessa, algumas pessoas ainda se demoravam junto aos escaparates. Olhei-o tentando perceber se se tratava de um manifesto, uma declaração de intenções, um sintoma. Os outros presuntos leitores não se mexiam mas deviam ser da família, porque era para mim que o rapaz falava, embora não me fitasse. "Estamos fechados", repetiu, como os polícias de trânsito antes do auto. Pus o livro na estante e saí. Nesta livraria não me fazem desconto.

Ler Devagar
Rua da Rosa, Bairro Alto
Lisboa

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