22 julho 2004

Ir e Vir

Três dias foi o tempo em segundos que contei até totalizar quando a Rosete voltou a aparecer. Deve ter ficado cansada do passeio que demos pela cumeada, ou foram os afazeres do dia que a tomaram. Ela vinha ainda com o mesmo brilho que lhe notei quando levantou a cara de onde a pousou entre as minhas orelhas, a pele amarrotada, os olhos quase estremunhados. Isso dissipou qualquer dúvida que eu ainda tivesse, esquecidas as fotografias com o colega trauliteiro. Ganhei coragem para falar das férias. Tenho ido para a praia por conveniência, as orelhas são muito sensíveis ao sol e por isso estou a perder o pelo. Ela disse que pensava ter visto uma velha ferida de guerra, não ganhei palavras para explicar porque nunca marcharia de farda na praça e que ao invés fui um estivador de carga. A conversa prolongou-se, cotovelo com cotovelo e um após outro os destinos foram riscados por uma razão nunca enunciada. Só poderia ser Cuba, nem quente nem frio, nem seco nem molhado, nem longe nem perto, nem praia nem campo, nem charuto nem danzón, nem brinde nem marisco, nem arquitectónico nem rural natural, por nada disso, pelo abraço longe dos olhares interrogatórios, só lá onde ninguém me vê como sou. Concordámos nisto, olhei para o lado como sempre faço quando muito quero uma coisa que aconteça se tiver de acontecer. E depois de regressar, pensei, podemos voltar. E quanto tempo poderemos nós continuar neste ir e vir de um asno? Toda a vida.

Jammes (ir e vir, ir e vir, ir e vir, zuzurra três vezes).
(três, e pouco mais, palavras finais d'O amor nos tempos de
cólera, G.G. Márquez
)

PC

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