17 setembro 2004

A Florista enganada

Uma rapariga cruza comigo todas as manhãs quando vou para a repartição. Deve ser florista. As floristas têm o ar triste de quem tem de decidir entre palmas e coroas, manter decentes flores embalsamadas, magoar sem lágrimas nos espinhos das rosas. As floristas dos centros comerciais são as mais tristes de todas. Sem luz, depressa lhes tomba o pescoço e quase sempre para o lado errado. A pele devia ser orvalhada como as pétalas das flores expostas. O cheiro das folhas em decomposição não favorece as floristas. Esta florista começou por cruzar os olhos comigo, depois houve um dia em que sorriu e agora- deve ter vindo de férias e percebido que sou um dos seus amigos mais fiáveis - diz-me adeus com a mão aberta. Eu não sou fiável. Nunca compraria flores nem as colheria dos prados. As flores morrem, arrancadas da terra. Engano a rapariga que deve ser florista e dou-lhe uma esperança falsa na vida quando lhe sorrio de manhã.

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