O sorriso do Mamute
Estamos no quarto do hotel, na cidade de L. O reposteiro deixa entrar muito pouca luz. Estou no canto do sofá, aninhada. O Mamute pôs as mãos nas minhas coxas, desceu até aos joelhos, afastou-os e deixou-se cair em cima de mim, procurando –me a boca com sofreguidão. Senti-me enclausurada. Vi uma vez um mágico numa praça que se fazia rodear de cadeias e cadeados e depois começava uma dança de movimentos vermiculares para se libertar. Foi assim que me soltei e disse qualquer coisa na minha língua procurando refúgio na casa de banho. À pressa enviei um sms ao meu namorado: “Estás apaixonado?” Enquanto o escrevia pensava num teste de escolha múltipla. Todas as interrogações seriam castigadas. Sempre me enfurecem as hesitações. Mas que resposta queria de facto ouvir? Carreguei duas vezes no botão Send e voltei à sala. O Mamute acendera um candeeiro e estava sentado no canto que eu ocupara. Era enorme. Tinha as pernas estendidas, a camisa aberta, o cabelo desalinhado e sorria. Pareceu-me um rapaz com quem acampei uma vez. Dormimos duas noites semi vestidos. Eu deixava-me abraçar e acariciar mas resistia sempre às investidas quando elas requeriam maior intimidade. Fingia-me adormecida e quando aquilo se tornava quase insuportável e a cabeça era um concerto de penetração afastava-o determinada. Quando nasceu o dia vi a cara dele e tinha este mesmo sorriso pacificado que me parece ser o comprazimento na derrota. Este domínio da violência comoveu-me e aninhei-me no colo do Mamute. O telemóvel tremeu lá onde o deixara. Mas deixei de o ouvir quase ao mesmo tempo em que deixei de ver.//sent by Loreta Granada
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