06 janeiro 2005

2046



Sim é deslumbrante. O amor é sempre deslumbrante. Uma mentira magnífica, como deus, a paz , a felicidade.
Os planos da filha mais velha no terraço do hotel. Os quartos de que não temos nunca uma visão de conjunto. O hotel de que conhecemos apenas o corredor espreitado à luz da noite, quando a mulher do quarto 2046 pode sair ou voltar. O sexo não é assim tão deslumbrante em 2046. Embora seja atraente a ideia de ser pago. Aliás todos os serviços, sobretudo os domésticos, deviam ser pagos, em dinheiro e não em géneros ou afectos, ou promessas.
As mulheres são magníficas em 2046. Enlouquecem suavemente por amor. Aprendem a língua do amado trânsfuga. Escrevem quando o escritor não é capaz. Morrem às mãos dos homens, nos lençóis do quarto 2046.
Não gosto do escritor, embora simpatize com o seu alter ego, o homem japonês que regressa alucinado de 2046. O escritor é um homem perigoso, que mistura nas suas histórias as mulheres reais que conheceu e diz as frases sem sentido de que o amor se alimenta: Love is a matter of time. It’s no good meeting the right person too early or too late- na versão inglesa. A pessoa certa? Lembra o Amor na Cidade. Cedo demais ou tarde demais? Que interessa o tempo quando ninguém regressa dos comboios que partem para 2046.
Não gosto de um homem que deixa à porta de um hotel a mulher que seduziu com um par de meias. Que diz que “nunca emprestou a sua pessoa”. Não há nenhum mérito em deixar voltar para Singapura uma mulher como Zyao Zhang. Homens destes merecem voltar sozinhos de 2046.

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