14 junho 2005

Um beijo nos santos populares



“Como perdem depois a urgência , os beijos?”

Nos santos populares beija-a. Ou é ela. Nos santos populares, de madrugada, não há beijos urgentes. São naturais como os milagres dos santos populares. Porque é que ele treme? Encontra o lábio dela, os dentes, a língua dura e perscrutante. A saliva dela sabe bem: alecrim, alcachofras, hortelã. Quando se afasta ligeiramente, vê-lhe a boca. Ela sorri um sorriso de triunfo, sucesso, patifaria, enlevo, deleite. Está a divertir-se. É muito excitante este sorriso. Ela beija a sorrir. Continuam. Mais húmido, mais fundo, mais trocado. À medida que o beijo vai crescendo a cara dela transfigura-se. Agora, quando ele de novo recua para perceber a cara que beija, encontra-a com os vincos da dor. E embora não a conheça, beija-a pela mulher que é e pela mulher que pressente nela.
Nunca se sabe como acaba um beijo. Aquele foi em lágrimas copiosas.

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