O tempo
O tempo não existe. Acho que já uma vez aqui tentei demonstrar essa evidência, pelos vistos sem resultado. O tempo passado não existe a não ser na memória dos seres com memória. De uma coisa que só existe na memória não se pode, verdadeiramente, dizer que exista. O tempo futuro, esse, seguramente não tem, até acontecer, nenhuma forma de existência material, que virá a verificar-se ou não. Se algo parece pacífico hoje, é essa impossibilidade em prever o tempo que virá. Resta-nos o presente. Mas se nos detivermos um pouco sobre este assunto, facilmente percebemos que quando tentamos capturar o momento presente, ele escapa-se como a sombra ao néscio, e se alguma coisa agarramos é o passado. Podemos decompô-lo sucessivamente. Mas mesmo esse instante que é um relâmpago, um estampido, um estremecimento da mente, quando o analisamos já não está presente, ou apenas como o mostrador de um relógio fuzilado. Esta reflexão parece-me tão difícil de rebater, tão independente de outra coisa que não seja o deslizar livre do pensamento, que seguramente já ocorreu a muitos homens, filósofos ou não.
Quando percebi que o tempo não existia, o mundo material deixou de fazer sentido. Se as tragédias só existem verdadeiramente na fracção milionésima em que podem ser algo mais que passado, então mesmo as nossas penas são suportáveis.
Quando percebi que o tempo não existia, o mundo material deixou de fazer sentido. Se as tragédias só existem verdadeiramente na fracção milionésima em que podem ser algo mais que passado, então mesmo as nossas penas são suportáveis.
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