As cartas de amor de António Lobo Antunes
Escritas por um jovem médico na fronteira do império mais miserável da história colonial europeia, as cartas foram editadas pelas filhas após a morte da mãe, que as guardou. Compreende-se a emoção, que é contagiante, e o orgulho. O escritor ainda não as releu, embora tenha apoiado o lançamento, de uma forma que só faz aumentar a estima dos admiradores entre os quais, por motivos históricos, me conto. A Memória do Elefante, a Explicação dos Pássaros e Os Cus de Judas foram talvez os livros mais importantes daqueles anos da minha vida, pela novidade da escrita e dos temas, pela personalidade do escritor que através delas se afirmava, irónico, desiludido, pelo efeito de proximidade à geração que naquela altura chegara à idade de trabalhar e se apercebia de que a festa terminara.
O escritor que ele se sabia está nas cartas de amor. E não é difícil de perceber que o material de que foram feitos os livros referidos foram aqueles anos de 1971 a 73, em que repetia à sua jóia querida que gostava tudo de ti e anunciava a escrita fatal onde se cumpriria o seu destino literário. Que nos livros do final da década esse amor fosse só uma ferida, não espanta aos cínicos que sabem que ele só é imortal enquanto dura. Um livro triste, se nos lembrarmos que provavelmente hoje ainda, homens que julgam ter um destino literário, escrevem cartas, provavelmente mails, a mulheres que provavelmente os acreditam.
Um livro que talvez interesse aos biógrafos de António Lobo Antunes, aos estudos literários e à memória da guerra colonial .
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