Primeira noite
Na primeira noite de exílio dormi no castelo da baronesa Sidonie Nádherny de Borutin. À entrada passei por pedintes que exibiam rastas, implantadas em quérions ressumantes. O quarto era tão grande que não aquecia, e na lareira, o fogo parecia apenas servir à iluminação. Fiquei a olhar para uma parede com uma gravura de um tal David Tenier, do gabinete de M.Marc René de Voyer, Marquês d’Argenson. A gravura representava uma festa flamenga, e Tenier fez-se representar em primeiro plano, numa atitude galante, mas discreta se atendermos às dimensões da figura. Ao lado havia um vaso com uma planta que entregava ao quarto, como tentáculos ameaçadores, enormes raízes aéreas. Fiquei a ouvir a vagarosa noite, à espera de descobrir alguma verdade na minha vida. Agora que não escrevo talvez consiga compreender alguma coisa, era o que pensava. Tinha que juntar a tinha florida dos pedintes, a planta e a sombra da planta sobre o quadro, os sons da floresta e o silêncio do castelo. De noite uma mulher entrou no quarto. Julguei que viesse a mando da baronesa, mas de facto eu ainda não conhecia Sidonie. Levantou-me a camisa e senti as suas mãos no tronco e depois descendo no ventre.
-Está frio, disse ela.
E nunca percebi se se referia ao quarto, ou ao meu corpo em desamparo.
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