O Primeiro de Dezembro
Partimos cedinho de Coimbra B. Não tão cedo como combináramos que o Tomás nunca chega a horas. Ele levava empadas de frango. O Estêvão a toalha branca. O Bonirre a máquina fotográfica, eu o cesto de verga e as bebidas. Parámos na pequena capela pentagonal, onde, na imagem do altar principal, o dragão parecia derrotar S. Jorge. O Ocidente do século V dividia-nos. O Tomás e o Bonirre, partidários da acomodação pacífica, pareciam ignorar Alarico, Radagásio, a devastação da Gália pelos vândalos, as campanhas dos suevos e dos alanos na Península Ibérica. Depois, quando já se sentia a maresia, o Estêvão introduziu o tema da ausência de imaginação das mulheres escritoras, cujas personagens parecem ser sempre duplos de si próprias. O Estêvão tinha um reduzido, mas convincente leque de exemplos, para lá de uma indesmentível experiência pessoal. Nada literária. Pouco dado a angústias, o Bonirre demonstrava, como sempre, um apetite contagioso. Não fotografava mas comia. O Tomás só se lembrava do José Rodrigues Miguéis. Como tínhamos deixado de fumar estávamos insaciáveis. O Estêvão resmungava sobre a inutilidade da toalha branca, embora o fardo do cesto fosse carregado por mim. Quando chegámos à ponte, ao mar aberto, às bebidas, tinham-se acabado as empadas, e no percurso, protestou o Tomás, tinha-se também perdido o significado da Restauração.
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