09 julho 2008

Os Livros Ardem Mal


Richard Wentworth


Pelo segundo ano consecutivo os meus meses foram pautados pela celebração literária, aqui frequentemente publicitada, que, na primeira segunda-feira de cada mês, um grupo de professores da Faculdade de Letras de Coimbra, leva a cabo no foyer do TAGV, a que chamaram Escaparate e depois Os Livros Ardem Mal. Comprei e li quase todas as sugestões de Luís Quintais, de John Gray a Edelman , de Paul Bowles a JG Ballard, passando por esse inesquecível O Antropólogo Inocente de Nigel Bartley. Rui Bebiano parece lamentavelmente ter trocado o palco do TAGV pela coluna da revista do Círculo de Leitores, depois da remodelação de F.J.Viegas, embora não consiga descortinar a incompatibilidade das duas prestações, tanto mais que o Rui é um inesgotável leitor e dono de um método invejável. Apolinário assegura, na reunião, a presença da literatura espanhola, de Pessoa e de Eça de Queirós.
Ao longo dos dois anos de existência o Escaparate reviu a sua fórmula e soube ganhar público sem perder qualidade. A associação com a RUC entrega a sonoplastia a um personagem pouco amável e bastante incompetente, mais próximo do body combate que dos estudos literários, incapaz de ensinar aos membros da mesa que devem falar para os microfones e indiferente à penumbra auditiva das partes laterais do átrio, onde se amontoam pessoas, muitas delas sentadas nas escadas.
Se a sessão tiver uma quebra, como por vezes acontece quando o Osvaldo se alheia do tema, pode-se sempre olhar pelas vidraças e ver os plátanos, e entre as suas copas o tronco putativo de uma palmeira que, como um arranha – céus, cresceu para a luz. Pode-se também pensar : onde estão os professores e os estudantes das Letras ( sessão com Frederico Lourenço), os historiadores (Irene F. Pimentel), os generalistas (Mexia), as prostitutas (Ana Lopes), os estrategas da alterglobalização, os militantes dos abaixo-assinados?
Osvaldo Manuel Silvestre é o centro de resistência das sessões, o lugar incombustível dos livros. Nas escolhas do mês, na apresentação e no interrogatório dos convidados, na selecção e na leitura de textos, o que Osvaldo diz e o modo como diz, tornam Os Livros Ardem Mal o maior acontecimento cultural da cidade, uma luz bruxuleante no cinzento dos dias analfabetos de Coimbra. A luz que vem de Carlos de Oliveira, Ruy Belo, Luiz Miguel Nava mas também de Musil e de Coetzee, a luz da literatura e a sua sombra.

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