Porque é dificil escrever em Agosto
Joseph Brodsky e Maria
Comecei por um livro de um homem sereno, Breviário Mediterrânico. Mas esse escrevera também o Epistolário Russo que encontrei a 3 Euros numa feira. A seguir li Koba the dread. E depois comprei e li Man is wolf to man e sem intervalos o livro de Eugénia Guinzburg.
Mandei vir o Gulag, uma história, de Anne Applebaum e outros que cresceram como uma arvore do mal e me taparam a minha musa, primeiro, o peixe no aquário, os bonsais e em breve tudo o resto
O mundo impassível, ignorante, pós- inocente. Ninguém quer ouvir as histórias desse tempo tão próximo. Os que ouvem, para me calar, falam da imensa crueldade do século XX. Os jovens de Praga 2009 não querem saber dos avós, que viveram com sofás coçados e pão racionado, nem dos pais, agora a comemorar sozinhos uma Primavera que acabou mal. Ninguém quer saber. Estou sentado à mesa. Há sempre comida a mais, sobra comida, comeu-se demais no mundo como dizia o pai de Luíza Neto Jorge. Não há conversa. Estas mulheres, estes homens não são meus pais nem meus filhos, não têm comigo nenhum dever de atenção, se falo não entendem, nem eu me esforço já. Se parassem de mastigar talvez vissem no fundo dos olhos da empregada eslava a imensa crueldade do século XX, as cidades destruídas da Alemanha, a nova geografia da Europa de Leste, depois da limpezas étnicas que varreram imperadores, burgueses, anarquistas, cinemas, cafés e sinagogas,e vissem os campos de trabalho no país aliado dos sovietes, e do lado de cá, ruidosa e fértil, a esperança sem sentido dos outros europeus, uma rosa doente.
Mastigo como eles. Comemos agora os peixes em extinção. É Verão. Abandonámos os animais, recolhidos pelos canis municipais. Vi como os cães incrédulos sobrelotam as celas. Os que chegaram há pouco agitam-se, impacientes. Os outros desistiram e já não comem. Os homens, as mulheres e as crianças que os abandonaram estão aqui, à mesa destes restaurantes, fotografam-se antes das sobremesas, fotografam-se com o chantilly, com o pudim abade de Lidl, com a mousse de manga. Estão nestas praias, festejam o quinto aniversário dos Morangos, é até onde vai a memória. Para trás ficaram 1 400 animais abandonados. Falo do Funchal. As crianças dizem segredos. Os homens exibem tatuagens. As mulheres engrandeceram os seios com o pudim. Depois vai ser reabsorvido e as mamas ficarão outra vez tristes. Mas será Inverno e antes do próximo Verão, antes de abandonarem outros animais adoptados, elas encherão os peitos, sem dor, com outro pudim entretanto aparecido, para a glória das praias e dos restaurantes
Etiquetas: Blake, Elisabeth Costello, Luíza Neto Jorge
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