29 setembro 2008

Porque (não) lemos


Yinca Shonibare

O programa Câmara Clara debateu ontem o Plano Nacional da Leitura( a partir deste momento designado por PNL). Ou melhor, uma lista de títulos sugerida pelo PNL. Viegas achava que a lista era incompleta e mal feita (vd Notas sobre um plano inclinado, revista LER, Setembro de 2008, pg 53, onde avulta a prosa divertida de Rogério Casanova e a mais séria do José Mário Silva e da Filipa Melo). A responsável pelo PNL, Isabel Alçada, defendia a lista, tal como ela existe (obviamente depois de expurgada das múltiplas e desfigurantes gralhas). Eu não percebi as diferenças, que deviam ser substanciais, a acreditar nos fugazes instantes em que Isabel Alçada perdeu o impecável controle dos seus 17 músculos faciais, levator labii superioris alaeque nasi excluído.
O diferendo veio depois da emissão de um compacto de propaganda governamental com locução comicieira e onde o PNL é apresentado como uma prioridade nacional. Viegas, que a meu ver devia ter denunciado o gato, defendeu então que a longa lista fornecida pelos responsáveis do PNL não pode ignorar o cânone e Alçada, qual cânone?, discordou.
Mesmo atendendo ao formato especial do programa e às qualidades da moderadora não foi fácil perceber os dados em debate.
Ambos se confessaram leitores, com nostalgia de quando se lia, se ouviam histórias e havia tempo.
Ambos desconhecem porque é que uns lêem e outros não. E porque é que há quem tenha avós excelentes e tenha crescido entre livros e não abra um exemplar. E leitores obsessivos que não tinham biblioteca em casa.
Talvez no debate, e sobretudo no PNL, fizesse falta alguém das neurociências, familiarizado com a investigação sobre os mecanismos da leitura, que
fosse capaz de explicar as operações cognitivas envolvidas na descodificação e interpretação dos símbolos, na organização de inferências e no desencadeamento de reacções emocionais essenciais ao acto de ler. Do momento da infância em que começam a ser notáveis e como depois se desenvolvem, face a que estímulos. O facto de uma parte esmagadora desses processamentos de informação ser inconsciente explica a nossa ignorância e perplexidade. Explica igualmente que o debate tenha acabado como começara: empatado. Sem vencidos. Não era para outra coisa que a amiga de Ajax ali estava.

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