«He loved beauty that looked kind of destroyed.»
Gostava dessa espécie de beleza
que podemos surpreender a cada passo,
desvelada pelo acaso numa esquina
de arrabalde; a beleza de uma casa devoluta
que foi toda a infância de alguém,
com visitas ao domingo e tardes no quintal
depois da escola; a beleza crepuscular
de alguns rostos num retrato de família
a preto e branco, ou a de certos hotéis
que conheceram há muito os seus dias de fulgor
e foram perdendo estrelas; a beleza condenada
que nos toma de repente, como um verso
ou o desejo, como um copo que se parte
e dispersa no soalho a frágil luz de um instante.
Gostava de tudo isso que o deixava muito a sós
consigo mesmo, essa espécie de beleza arruinada
onde a vida encontra o espelho mais fiel.
Rui Pires Cabral
AVERNO 027
Rui Pires Cabral, Oráculos de Cabeceira, 56 pp., 11 euros
(Tiragem Única de 300 exemplares)
Capa e ilustrações de Daniela Gomes. Paginação de Inês Mateus.
Etiquetas: André Bonirre
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