12 junho 2010

Sócrates inocente. Os culpados somos nós


Jeremy Melvey



O Expresso publica na íntegra o Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito ao caso TVI.
Apesar do comportamento dos representantes do PS e do presidente da Comissão, da campanha que os comentadores encartados e a maioria dos jornalistas levaram persistentemente a cabo ridicularizando a actividade da Comissão e não permitindo à opinião pública tomar conhecimento dos aspectos fundamentais da inquirição, sempre ocultados pelo fait-divers e pelo folclore; apesar do comportamento arrogante do primeiro-ministro que não compareceu presencialmente e do carácter demencial das respostas de Vara; apesar do homem-de-mão do PS e do governo se ter recusado a responder à Comissão; apesar do presidente da Comissão ter proibido a utilização das escutas a Sócrates e Vara; apesar de tudo isso e muito mais a Comissão elaborou um relatório que vai ao arrepio da tradição parlamentar portuguesa e restitui ao Parlamento a sua função de vigilância dos actos do governo, nomeadamente num aspecto fundamental do funcionamento da democracia, a liberdade e pluralidade de imprensa.

Vale a pena ler o documento, as limitações à acção da Comissão, os depoimentos dos diversos inquiridos e confrontar a actuação dos membros da Comissão no esclarecimento da verdade e no respeito pela dignificação do trabalho parlamentar.

Destaco das conclusões:

10. Tomando por referência o debate parlamentar em que interveio o primeiro- ministro e em que este, pela primeira vez, aborda publicamente o negócio PT/TVI – dia 24 de Junho, com início às 15h – o primeiro-ministro e o Governo tinham naquela data conhecimento que a PT estava a negociar a compra de uma participação na TVI/MEDIA CAPITAL.

Diferente questão, é saber como e quando o primeiro-ministro tomou conhecimento do negócio PT/TVI.

17. A CPI não dispôs de condições para identificar a fonte particular que esteve na origem do conhecimento do primeiro-ministro sobre o negócio PT/TVI, nem quando tal ocorreu.
18. A dificuldade em identificar a fonte particular, através da qual o primeiro- ministro tomou conhecimento do negócio PT/TVI, resulta do facto, demonstrado e comprovado pela CPI, de ele ter extravasado as fronteiras das empresas nele interessadas e de ter chegado ao conhecimento de diversas pessoas sem qualquer ligação ou relação com aquelas empresas ou com aquele negócio em particular e que, nalguns casos, são das relações pessoais do primeiro-ministro e/ou com ele apresentam afinidades político- partidárias, como é o caso de Armando Vara.
19. A recusa de Rui Pedro Soares em depor perante a CPI, as limitações invocadas por Armando Vara e Paulo Penedos nos respectivos depoimentos à CPI e as respostas do primeiro-ministro à CPI, não permitiram esclarecer se, as conhecidas e reconhecidas relações pessoais e político-partidárias existentes entre eles e as conversas que mantiveram enquanto o processo decorria, estão na origem do conhecimento revelado pelo primeiro-ministro sobre o negócio PT/TVI.


E não resisto a reproduzir um período da introdução:

A CPI obteve informação até então desconhecida, esclareceu muitos equívocos, deu transparência a muitos aspectos sombrios, identificou e desfez inúmeras incoerências e contradições, revelou as fragilidades e a falta de credibilidade de muitas afirmações e declarações proferidas pelos principais intervenientes no processo de aquisição da TVI, quer antes quer depois do início dos seus trabalhos, dentro e fora das audições.
Este património de trabalho, plasmado nas páginas deste Relatório e nas suas Conclusões, permitiu o apuramento dos factos e a identificação das diferentes responsabilidades dos protagonistas deste longo e persistente processo de aquisição da TVI e das tentativas de alterar a sua linha editorial.


Acho por isso estranho, e só explicável pelo obscurecimento da Razão que a paixão partidária e o comportamento tribal induzem mesmo nas mentes esclarecidas, que os apoiantes de Sócrates na blogosfera não vazem os olhos e se dediquem apenas aos negócios e à preparação da travessia do deserto em condições de conforto.
Confundir a acção política da Comissão com a acção de investigação que cabe aos desacreditados órgãos da justiça é um golpe baixo. Esperemos, pelo menos, que os que hoje desacreditam os deputados por agirem "como polícias", amanhã não se calem quando se constatar que os polícias parecem agir como políticos.

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7 Comentários:

Blogger harness disse...

este governo é uma vergonha. aliás, complemento, estes governos têm sido uma vergonha incrível

"The more things a man is ashamed of, the more respectable he is." (george bernard shaw) -> o que diz muito desta cáfila

domingo, junho 13, 2010  
Anonymous Anónimo disse...

Sim, eu culpado me confesso. Mas o meu voto ele não caça mais!

domingo, junho 13, 2010  
Blogger Isabel disse...

Luís

Cada um escolhe o lado de que tem vistas mais do seu agrado - uns e os outros.

Harness

sempre me espanta, e não me parece que diga bem de quem o faz, a facilidade com que alguns apelidam os outros de "cáfila", cambada etc

segunda-feira, junho 14, 2010  
Blogger harness disse...

cara isabel,

nunca reflecti sobre a facilidade ou não em apelidar "os outros" de cáfila. mas, e confiando na sua asserção, plenamente de acordo: felizmente a última vez que usei essa expressão data de novembro de 1987.

quanto à caracterização em si, repare: sem querer ofender (e na minha opinião, embora julgue estar fundamentada em factos e, mais relevante, na realidade objectiva) há mais de trinta anos que a acção dos sucessivos governos se pode caracterizar alegoricamente como um deserto. não um deserto de ideias, porque ideias e reformas têm tido muitas, mas um deserto porque tudo o que seja progresso ((com particular enfoque no direito ao trabalho com direitos), tudo o que seja indústria, tudo o que seja cultura, às mãos destes senhores é reduzido a pó, a areia.

aparentemente a grande maioria de nós vem vivendo pior, de dia para dia. menos eles (e "amigos"). e quem é que vive bem no deserto?

os camelos.

segunda-feira, junho 14, 2010  
Blogger Luís disse...

Isabel, eu gostava que me dissesses: li o relatório e a minha opinião é esta. Eu respeitaria a tua opinião. E gostava que me desses a tua opinião sobre o amigo do Sócrates, o Vara, E sobre o Primeiro dos Socialistas de Coimbra. O representante dos socialistas no Parlamento.
Eu não subscrevo a designação de harness. Sabes como me identifico com os outros animais e, olhando do meu lado, os camelos me despertam ternura e os donos de camelos urticária.

segunda-feira, junho 14, 2010  
Blogger Isabel disse...

Luís, mas isso é o que eu não farei, ler o relatório. Porque, não me interessa, há coisas muito mais interessantes para ler. Só constatei o que qualquer um pode constatar, basta ler dois ou três jornais, dois ou três blogs para verificar o que escrevi, cada um lê o relatório como mais lhe agrada: de modo a confirmar os seus pressupostos. A minha agenda não é feita pelos jornais e pouco me interessa também o Vara. Instintivamente não gosto do socialista de Coimbra, mas daí não tiro qualquer ilação ou generalização.

segunda-feira, junho 14, 2010  
Blogger Brinquinho da cantareira disse...

Nunca teve o meu voto...
É UMA VERDADEIRA NODOA...

sexta-feira, junho 18, 2010  

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