Sem palavras
Clarisse d'Arcimoles
Em janeiro David Lodge terá 76 anos e a sentença de silêncio apertar-se-á em seu redor. Julian Barnes, 65. Manfred Encher, 67. Luísa Neto Jorge morreu há 21 anos, mais nova do que eu, como o Nuno Bragança. Há sete anos que o António Franco Alexandre se calou. O Magalhães destruiu , como se diz, a sua obra. John Le Carré chegou aos oitenta, no ano em que sai Um Espião dos Nossos. O Vila-Matas tem 61 e esteve mesmo à beira de desaparecer. Coetzee será em breve um homem lento e parece ter concluído a sua peculiar autobiografia. O Philip Roth tem 78 anos.
O Philip Larkin morreu em 1985. O Bolano mal o conheci. Todos velhos, surdos, mortos e eu com eles, como uma camisa em farrapos arrastada na corrente, sem outras palavras que as palavras deles, sem outro mundo que o mundo pequeno que foi o deles.
Morreram quase todos, como ele. Já não há nas ruas da sua cidade uma só pedra que tenha pisado. Uma noite acordei e, no corredor da casa que habitava, reverberava uma cinza incandescente. Sabia onde encontrar as palavras que contavam isto, num livro de capa castanha do Nuno Júdice. Escrevi-as com tinta permanente e fui pô-las debaixo da pesada jarra das flores, na esperança pueril de que a minha mãe as haveria de ler, antes das chuvas. Hoje nada resta dessa febre: o mármore, a terra remexida, a memória dessa noite, as palavras roubadas, a agitação do roubo.
Etiquetas: Lodge e outros
2 Comentários:
um abraço
Impressionante. Não o/a conheço de aqui até Adão ou o que seja, mas temos os mesmos gostos literários.
Tenho (e já li...) esses livros todos que mencionou.
Pormenor: porfavor não ler o Le Carré a não ser em inglês. O homem andou num colégio dos de Oxford p'ra quê , ser lido em 'tuga' ?
"Our kind of Traitor", ISBN: 978-0-670-91902-4 , www.greenpenguin.co.uk
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