10 setembro 2008

A esquerda (do Nebraska) e Palin



Os europeus não vão votar nas eleições americanas, grande injustiça. Mas aos que as comentam pede-se alguma contenção. Julguem Palin por aquilo que ela é. Se acham que o destino de um jovem urso é ser cadáver embalsamado a decorar gabinete, se gostam de crustáceos como centro de mesas, se acham que foi deus quem mandou fazer a guerra do Iraque e oleodutos no Alasca, se acham que devemos andar armados, rezar antes de um jogo de basquete e casar à pressa na adolescência para lavar as manchas do sexo penetrativo, assumam que gostam de Palin. Não tem mal gostar de Palin. Atrás de Palin há um urso esquartejado, um sofá e um vidro e por detrás do vidro há um ser humano e é Palin. Conheci Palin. Era a miúda que estava sempre na Comissão Central do Baile dos Finalistas, mesmo antes de sermos finalistas, que ia ao Curso de Verão dos jovens do Partido em Breve no Poder, que, quando fizemos greve às aulas, furou o piquete num carro da Guarda Nacional.
Há quem goste de mulheres assim. Com as mamas à frente e o cabelo apanhado atrás. Não é preciso encontrar não-razões para gostar de Palin. Os comentadores que não têm coragem de gostar de Palin por aquilo que ela é, no entanto, sentiram imenso alívio porque um blogger de Forth Pierre, South Dakota, um desesperado como eu, de esquerda, claro, disse que ela não-sei-quê, coisa infame. E também houve um jornalista de Rushville, Nebraska, de esquerda, claro. Estavam assim à vontade para gostar de Palin. Perante dislates desses, da esquerda, sopraram para o lado dos ventos republicanos. Não importa que digam que Obama é secretamente muçulmano, jurou sobre o Corão e, quando canta o hino não põe bem a mão no coração. Não importa que digam que ele é o Anticristo, ou que digam que não é o Anticristo porque é preto e lendo a Bíblia, não consta que o Anticristo seja preto. Isso foi a direita que escreveu e disse e pôs a correr. A direita pode dizer o que quiser. Os comentadores sérios desculpam tudo, porque a direita é mais ou menos irresponsável. Agora a esquerda. Quer dizer o blogger de South Dakota. Imperdoável. O que a esquerda disse é imperdoável. Podemos gostar da Palin à vontade. Uma vítima, a Palin. Os comentadores sérios fecham os olhos ao urso e ao crustáceo e preparam-se para explicar o fenómeno Palin, uma mulher americana, a encarnação do novo paradigma, dos tempos que estão a mudar, ah, agora a mudar para o lado certo.

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