03 novembro 2009

Marchar, marchar

Como factor identitário cada país cria um inimigo, para uso dos poderosos , no mesmo pacote da bandeira e da selecção nacional, fazendo-nos crer que temos mais a ver com o Vara, o Loureiro ou o Coelho que com os Benitez, o Benoit Garrel ou o John Samper.
Um bom inimigo dos portugueses é a gripe A e o (H1N1)v 2009. Este H1N1 é um vírus português, um vírus do Sócrates. Olhem para Valença do Minho. A crer nos telejornais é o caos, uma vila medieval no começo da peste. Mas se passarem a fronteira, e a jornalista da TVI, da escola do Gato fedorento fê-lo – o que vemos? Nada. No pasa nada. Não sabem da gripe, se adoecerem adoecem, ora essa, nem percebem bem o interesse da senhora, respondem porque são educados.
Aqui, a gripe ocupa os jornais e os noticiários. Mal aconselhada, a ministra continua a ser a Mãe da gripe, sem ver que a médio prazo se pode tornar na sua Viúva. O inevitável Prós e Contras de segunda –feira demonstrou que não se pode ser bom português e contra a gripe. Eu passo metade do meu tempo a ser interrogado sobre a gripe. E a escrever posts originais como este.
A gripe A é o flagelo de que o país precisava. Para um paísinho, um vírusinho. A vergonha dos Orthomyxoviridae. O H1N1 v 2009 é o inimigo descartável, a Abissínia, a Polónia, a Áustria de Portugal.
Existe, e está dentro de nós. Acabou com os beijinhos. Mas nós já não beijávamos de facto. Encostávamos meia cara displicente ou dizíamos “ beijinhos”- uma saudação que tem a marca dos tempos, falsamente íntima, sem contacto nem risco.
De vez em quando mata. Mas os nossos Institutos rapidamente demonstram que a culpa da morte está no morto. O nosso inimigo é benigno. As vítimas são colaterais, gente que ia a passar e, mesmo sem saber, estava tão secretamente doente que não merecia cá andar. Temos sido leais com o nosso vírus. O H1N1 só mata nas estatísticas, só mata no balanço final. Nenhuma morte individual que não seja desclassificada.
Ele deu-nos uma razão de existir e nós não o deixamos transformar-se em vilão.

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7 Comentários:

Anonymous blue disse...

convém distrairmo-nos um pouco dos desempregados, não achas? os jornalistas já devem estar fartos de tanta miséria, pelo que um vírus assim vem mesmo a calhar...

terça-feira, novembro 03, 2009  
Blogger Pedro Viseu disse...

O português, como campeão das baixas médicas, fica logo doente só de pensar que uma boa doença lhe pode dar uns dias à lareira. O caso da gripe h1n1 é exactamente um daqueles em que esse fado se manifesta. Independentemente de estarem ou não infectados, fazem crer que poderão vir a estar e, para que isso não aconteça, há que ficar doente antes mesmo de a doença o afectar.

PS: espero nunca "apanhar" agripe h1n1.

terça-feira, novembro 03, 2009  
Blogger Carla de Elsinore disse...

luís , sabes que eu até não sou dessas coisas e, infelizmente, vivo o "histerismo" por dentro.
em todo o caso, em espanha, e até ao dia 22 de out, tinham morrido 63 pessoas com gripe A. se calhar o motivo pelo qual "não se fala" do assunto não é dispiciendo (se calhar é o mesmo por que não se fala de outras coisas, não fica muito bem).

quarta-feira, novembro 04, 2009  
Blogger Carla de Elsinore disse...

relembro, por exemplo, que em espanha também pura e simplesmente não se falava do prestige.
só começou a "ser notícia" depois dos órgãos de c.s. interncionais "mencionarem" a pequena nódoa.

quarta-feira, novembro 04, 2009  
Anonymous Anónimo disse...

O medo é o que melhor vende... sempre foi, desde tempos idos; o medo do inferno e do diabo, do castigo divino, dos gajos que comiam criancinhas e dos gajos que nos soltavam a língua; o medo de falharmos; de sermos maus pais, maus filhos, maus cidadãos; enfim o medo da morte... essa puta que vive na rua, nos jornais e tv, que se deita connosco e nos bafeja o pescoço sempre que queremos viver um pouco mais... lembrando-nos só no fim a história do outro que morreu sem ter vivido.

Bom poste e obrigado pelo blog
Pedro Gama

quarta-feira, novembro 04, 2009  
Anonymous Anónimo disse...

"Fidel Castro acusa Obama de introduzir gripe A em Cuba"

Foi por medo que uma vez viajei em 1ª para os EUA. Medo do outro que me deixou o lugar. Tinha ocorrido um mês antes o 11/9 onde morreram efectivamente pessoas.

A gripe mata? Tudo mata pela condição única de sermos mortais. Situação única que não conseguimos inverter.

Por medo deixamos de viver. Não há pior morte...

TB

sábado, novembro 07, 2009  
Blogger Zana disse...

Pois!

terça-feira, novembro 10, 2009  

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