31 março 2010

Vinte mil léguas submarinas






- Não há dúvida, professor. Porém, com o método antigo, os proprietários lucram mais. Sabe quanto ganham esses pobres pescadores que arriscam a vida e que nunca chegam a ficar velhos? Recebem cinco centavos por concha que contenha uma pérola, e são tantas as que se encontram vazias!

- Mas, isso é um absurdo - respondi. - Cinco centavos para essa pobre gente que enriquece seus patrões!... Não entendo...

- Pois é assim mesmo, professor. Isso é a civilização. A propósito, sr. Aronnax - disse o capitão mudando de assunto. - O senhor tem medo de tubarões?


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29 março 2010

Em seguida


Georg Schrimpf



Se ele diz depois ela diz
em seguida
Um menino não se aleija .
Magoa-se.

Ele diz cuecas e ela logo
boxers.
E encurta o ire dele, para um rápido
ir.

Quem não quer uma mãe
assim.
Conhece bem os de cima.
Prepara - o
sem sotaque nem história
para que ninguém
o veja
como é.

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Abriu a porta e descobriu





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26 março 2010

Por dentro de dentro






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24 março 2010

A ver se vê no zinco





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22 março 2010

Hasta la vista







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16 março 2010

Solicitação


Filipa Júlio



Eduardo, leio e naturalmente aprecio, o que escreve da Literatura. Mas por favor, não me contabilize na guerra do Alecrim e do Vitalino, sobretudo quando me parece pôr do lado da Manjerona. Eu não tenho nada a ver com isso, estou profundamente desinteressado da claustrofobia do PSD e da brisa jugular que lhe alegra os dias. Disso, do que está por detrás disso, dos lados e pela frente. Deixe-me continuar a ler com prazer a sua crítica literária e ignore os meus desabafos, que são apenas vacilações na firme decisão de me manter afastado dos jogos florais da vossa cidadania de patrícios.

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Joaquim Manuel Magalhães



Há no trabalho poético mais recente de JMM (O Toldo Vermelho, Relógio D´Água) uma contradição insanável. Toda a destruição opera num objecto preexistente. Pode ser depurado. Pode ser reduzido à sua essência. Pode ser tomado como matéria, cal, argila, tinta, som, os neuromediadores mobilizados pelas áreas do cérebro onde se formam as palavras. Mas foram os budas das colinas a ser destruídos por talibans enlouquecidos. Antes dos Budas havia a colina. A destruição escolheu as estátuas. Perceber profundamente a destruição e o que dela resultou, pressupõe o conhecimento da coisa destruída. Ironicamente, o texto que se quer único, remete e recorda sem cessar o texto mutilado. Como o que resta. Mesmo que reste apenas a "pressão do prepúcio na glande".

Ver
Luís Miguel Queirós

H.G. Cancela

Máscara & Chicote

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15 março 2010

Atitudes, palavras e obras da gente bem educada

A lei da rolha


Annelise Kretschmer


À hora em que Pacheco Pereira nos tentava dinamitar o cérebro com uma evocação de Rafael Bordalo e da sua sátira à Lei da Rolha, os congressistas do PSD aprovavam, com a pudica reserva dos futuros líderes, a pena de expulsão aos que ousem criticar os dirigentes. Ficam assim os cidadãos do PSD impedidos de falar. A medida seria perfeita se abrangesse os dirigentes. Um partido unido pelo silêncio é o que faz falta. Ainda não tinha digerido a pérola estatutária já o senhor Vitalino Canas se apressava a comentar. Daqueles comentários pomposos e circunstanciais, com a bandeira do Rato atrás e boquinha de virgem ofendida. O senhor Vitalino, quebrando a regra não-escrita de que partido não se pronuncia sobre a vida interna de partido - que é a contrapartida institucional do saber popular que ensina a não nos metermos entre marido e mulher mesmo quando se ouvem gritos - veio evocar a liberdade e o 25 de Abril. Acontece que, pelo menos desde que mataram a Rosa Luxemburgo, não me lembro de ter visto um socialista a criticar a cúpula dirigente.

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12 março 2010

O partido do senhor Silva


Laslo Moholy Nagy


Quando me candidatei deixei o partido de que faço parte.


O senhor Silva a Judite de Sousa (ouvido na Antena 1)

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09 março 2010

As gatas-das-botas


The Sartorialist


Bem-aventuradas as miúdas quase anorécticas que ao longo destes três meses de frio e chuva criaram o meme do Gato-das-Botas. Pernas magras com leggins ou meias escuras; saia muito curta, a rasar, com alguma roda discreta e botas de cano alto; preparadas para a cheia, triunfantes, cada passo delas eram sete léguas na direcção da primavera - infelizmente para longe de mim.

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CE N'EST PAS UNE REVOLUTION, SIRE; C'EST UNE MUTATION!

07 março 2010

Shop by colour




Vou pelo carreiro em obras a que chamam A1. Troço Coimbra/ Porto. Chove assim há três meses. Quando a chuva pára, o céu alto é cor de cinza ( Down-Pipe, 26 na paleta F&B). O trânsito, o silêncio, a hora, as terras martirizadas das bermas conferem à viagem um aspecto fantasmagórico. Vejo uma câmara assestada no vidro. Estou a ser filmado. A câmara está do outro lado da estrada, instalada a mais de 3 metros de altura, sendo o conjunto semelhante a um poste de iluminação. O cérebro distraído dos condutores deve ler poste de cada vez que aquela imagem impressiona a retina. Candeeeiro ao longe . Uma mensagem anódina. Bem diferente de: Câmara de vigilância para te foder. É feio? Brutal? Estou a ferir a vossa sensibilidade cidadã? É a percepção correcta.
Com os neurónios alerta, totalmente desatento ao tráfego, começo a contar as câmaras. Só as das bermas. Dou de barato os viadutos armadilhados e outras camuflagens da malandragem. Cada 2 kms, de 30 em 30 segundos à velocidade maxima permitida, há uma câmara. Se a densidade for a mesma ao longo da A1, seremos filmados 25 vezes pela frente e outras tantas pelas costas, entre Coimbra e o Porto. Não sei o que se passa no troço-eternamente-em-obras onde a limitação de velocidade é arbitrária e os emboscados esperam os incautos. Estou a ser filmado. Faço gestos feios para o olho escondido do meu vigilante. Dedos no nariz, punho fechado, o gesto do orgulho turco, a língua de Einstein. Estou condenado a perder este jogo. O céu abriu um pouco (Green Smoke, 47 F&B).

04 março 2010

Rossum’s Universal Robots





In the introductory scene, the robots are dressed like people. They are slightly mechanical in their speech and movements, blank of expression, fixed in their gaze. In the play proper they wear linen blouses seized at the waist with a belt and on their breasts wear a brass number.

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02 março 2010

Dias, intermitências de sol e treva *





"A quinta parecia viver fora do tempo. Numa pausa do tempo. A memória, os factos, as coisas, dir-se-iam flutuar ao acaso. Hilário não conseguia dar-lhes uma ordem coerente. A solidão, que tanto lhe agradara, começava agora a perturbá-lo, dissolvia no mesmo ritmo confuso o passado, o futuro. "
(pág. 61)

(*) Casa na Duna, Carlos de Oliveira


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01 março 2010

O homem de botões de punho



foto de The Sartorialist

Há um tipo de homem que usa botões de punho. Ou que pode usar botões de punho. Raramente usa. Mas um dia olhamos, e lá estão eles. Os botões de punho. Não acreditamos. Voltamos a olhar. Não, não é a “petite tache” de que falava o Barthes. É um enorme borrão, de ambos os lados, uma bandarilha pronta a espetar-se no flanco aterrado dos que ainda não acreditam. Há camisas assim. Que se atravessam na nossa vida e pedem botões de punho. Aquela era assim. Uma fatalidade em que devia ter reparado quando a escolhi, na loja do costume onde me visto, ou onde, apressado ou complacente, deixo que me vistam. Uma camisa de colarinhos e punhos brancos e riscas azuis. O Camisas deve ter uma dúzia destas, alinhadas no closet, uma para cada cruzeta. Nenhuma como esta camisa horrível que junto ao umbigo ostenta uma etiqueta da marca, um toque de modernidade. E na extremidade das mangas lá estão os punhos dobrados, duas dobras, quatro casas a pedir botões. No caso os botões de punho do meu pai, por sinal feiotes, e que nunca me lembro de lhe ter visto, embora o meu pai fosse o tipo de homem que podia usar botões de punho e lenço no bolso do casaco.
Enfiei os botões e andei todo o dia de ontem com eles, inconsciente do efeito produzido, porque os homens que usam botões de punho não se apercebem do que acontece de cada vez que levantam um braço, seguram o queixo como as intelectuais na foto de entrevista, coçam o nariz, apoiam a testa. Estava calor dentro de casa e tirei o casaco. E foi assim que estive, toda a tarde, sem arregaçar as mangas, porque isso é difícil quando se usam botões de punho. E tive uma tarde feliz. Ninguém me fez perguntas difíceis, ninguém me confrontou com os mistérios da minha existência, os crimes que terei cometido nas encarnações pretéritas, as escolhas erradas, as pequenas e grandes traições. Ninguém me disse que eu desiludira as grandes esperanças em mim depositadas. As pessoas viam os botões de punho e aceitavam-me assim. Um pobre homem, amansado pela vida, resignado à fatalidade de uma camisa às riscas, com direito a viver sem ser questionado, como o cão que se enroscava na lareira ou o pássaro que batia na vidraça.

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E você, já recicla o óleo dos fritos?





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