30 julho 2004

A voz dos bloggers

Um dos dias em que fiquei a tomar conta disto dediquei-me a telefonar para os outros blogs. Um dos gajos de la plage diz que é muito bom em electrónica e conseguimos acesso aos telefones portáteis dos bloggers. Foi um espanto. Aquilo a que se pode chamar uma revelação literária. Comecei por uma mulher que escreve os versos mais desesperados da blogosfera, daqueles que as miúdas só deviam ler depois dos dezassete e com atestado de saúde mental. A mulher que tinha acabado de escrever "nunca mais entrará em mim o teu desejo. nunca mais o desejo. nunca mais." atendeu no meio de sons que não escondiam o sítio onde afogava as mágoas: um cocktail mundano. O rapaz que passa a vida a queixar-se de que nenhuma mulher lhe liga, nem se dignou atender o telefone. Foi a namorada que me disse para tentar mais tarde. O blogger que viaja sem cessar, estava na biblioteca. A Mulher Barbuda tinha uma deliciosa voz, quente e com os rrr rolados, tive medo que fosse uma chamada de valor acrescentado. O blogger mistico tinha uma voz fria. A miúda que edita as suas fotos assumidamente tinha uma voz embalada em noites e em alcoól.
A tua voz, velada, com os ditongos abertos, a tua voz lisa como a tua escrita foi a excepção, a única excepção. Só tu não tinhas nickvoice. Tudo o resto era literatura.
sent by// Silvano

O amor

O amor existe. Foi avistado pelo Jamiroo num banco de jardim, onde há vinte e cinco anos os pais gravaram os nomes, a canivete. O Jamiroo é o melhor dos observadores e devemos acreditar no seu avistamento. Provavelmente o amor existe e é um fenómeno com um período de vinte e cinco anos. O que é que o Jamiroo e uma mulher que tem de ser linda, sensível e inteligente, fizeram depois dessa descoberta? Separaram-se numa estação. Ele ficou com o nome dela num Moleskine (livro negro onde o amor escreve os seus epitáfios). O amor, provavelmente, volta daqui a vinte e cinco anos num banco de jardim.

Darfur, Darfur

Têm que perecer multidões para que os céus estremeçam? , pergunta Coetzee/Dostoeivsky, revoltado pelos céus de Dresden não terem avisado da morte do filho em Petersburgo.
Mas morrem multidões e o céu não estremece. Mas o céu estremece e a matança continua.

29 julho 2004

A Espuma dos dias

Enquanto é noite, e enquanto ela cá está, vale a pena sempre vale a pena.

Todos os do Mal (uns em directo e outros de sms)

Austin A 90 Atlantic

Recebeu uma mota no dia de anos. 18 anos. Foi direito à casa dela, confiava na surpresa do efeito de Doppler. Mas os seus olhos nem o viram e bem pouco a Harley-Davidson, novinha em folha. O outro, o rival, rondava já a casa, chegou primeiro e mais convincente, um descapotável [*] fabuloso, com três faróis dianteiros e um roncar imbatível. Nem um nem outro, nenhum, no fim quem a levou (e à mãe, viúva, foi o que correu na altura) foi o venezuelano, sorriso de dente de ouro e promessas de viagens. Consta que se ficou por Lisboa. Não souberam mais dela.

Anos passados, rivalidades passadas, o carro encostado na garagem, ele propôs-lhe a compra. As recordações da casa da curva das rolas, não foi o que invocou. Tirou uma fotografia que trazia guardada na carteira. Um mar de gente, de pé no carro aberto Humberto Delgado, Porto, Maio de 1952.

[* Ficha técnica: Austin A90 Atlantic cabrio, azul metálico, FL-16-12, em restauro algures em Gondalães, concelho de Paredes]

André Bonirre

A ler

Um nome mais verdadeiro

Ontem, a um hora indecisa da tarde, vieram-me à cabeça as palavras insensatas das mulheres. Ou não foi bem assim. Uma zona do cérebro em apuros irradiava o que podiam vir a ser palavras, se escrevesse. E o centro dessa ondulação era feminino, bem sentia. Faltava-me um nome. Podia ser Zézinha. Mas pensei que ia ser motivo de confusão. Um nome eslavo que um til transformasse numa coisa terna em castelhano. Talvez o nome da irmã que deixou de ler blogs. Quando essa asfixia me voltar o meu nome será Cristininha.

28 julho 2004

Virá o Verão

Quando o Verão vier há-de ser amarelo como o fundo do blog da Charlotte.

Adições

Previsão Fácil

O Manifesto Comunista do século 21 será escrito num blog por uma mulher como Isadora.

Darfur

Palombella Rossa (que tem desde há tempos o template das Terras do Nunca) posta sobre Darfur e o genocídio que está a ser cometido, com o silêncio cumplice da comunidade internacional (como no Ruanda). Malícia de Mulher e Insensatez chamam a atenção para Nuno Guerreiro e a campanha que este vem desenvolvendo na Rua da Judiaria. Absolutamente obrigatória a visita a um dos nossos blogs maiores e daí para Darfur.

Toda a Terra arde

Toda a Terra é a terra que temos para viver, é toda a terra
Não podemos perdoar toda a terra que arde inutilmente, as matas de Terras do Bouro, no Gerez.

Short story n A Tasca

O post que vinga duas gerações de jovens românticos humilhados. Jamiroo, depois dessa ficas definitivamente com o pelouro da educação sentimental. A propósito: No Botânico é sinistro. No Choupal, soturno. No banco de trás do descapotável, snob. No Observatório, arriscado. Na estrada de Penacova, fora de mão. Nos campos do Mondego, excessivamente bucólico. No miradouro sobre a Sé Velha, com paisagem a mais. No jardim do Seminário Maior, intimidatório. No Pátio interior do Colégio de S. Jerónimo, doentio. Na varanda do Instituto Justiça e Paz, sublime.

Os frangos de Zurbia

Obrigado Santos Passos pela frase da Dra. Zurbia. Não me vou esquecer : os frangos mais fracos e tristes salvarão os meninos em risco. Eram todos assim os frangos nas capoeiras dos bairros em que cresci, fracos e tristes, como se nos pátios, estivesse em edital a prescrição da Dra. Zurbia.
Silvano

De novo no Parque.

Ontem fui outra vez ao Parque. Ouvi as conversas. Eles aceitam-me se eu não der nas vistas e talvez as gajas achem mistério no meu silêncio. Falavam do filme do Jarmusch. Uma gaja disse que eu era parecido com o Bill Murray. Porquê, parece sempre estar a pedir para o esconderem do patrão, perguntou outra. Não, parece é capaz de beber o café pela cafeteira, riram-se todas. O meu amigo bateu-me nas costas e quando os risos pararam disse: Se o gajo é parecido com alguém é com o Tom Waits. Já no Secundário tinhas o cabelo assim, não era, chapa. E eles concordaram todos, com gravidade, que eu era mais o Tom Waits e com uma ponta de orgulho senti que já fazia parte daquele grupo. Depois levantei-me e passei pela zona escura. Pensei: É aqui que a noite espalha o seu silêncio vegetal. A seguir pensei no que queria da vida. O que eu queria era fazer o inter-rail.
Sent by//Silvano

Mário

Mário, obrigado pelas indicações, encontrei o seu carro facilmente.Era como dizia. O gajo estava descalço, com os joelhos encostados ao queixo e a cabeça atirada para trás. Mas você não viu tudo ou não quis ver. A mulher parecia uma estátua que tivessem moldado no corpo dele. Para cada dobra dele ela tinha uma saliência. E a lagarta. Como diabo foi aquilo lá parar. Chamei a polícia. Você tem razão Mário. Você é arraia miúda e isto vai sobrar para você.
sent by//Silvano

Au Hasard Balthazar: camisola de lã.

Por uma vez Rosete esteve noiva. Ela alegre e viçosa, ele de baixa estatura mas garboso. Para se abrigarem do calor e do ataque incessante das moscas, acharam-se em casa dos pais dele. A mãe, com os dedos de pele áspera, tinha tricotado uma camisola de lã de decote generoso. Apesar do calor, pediu-lhe que a experimentasse ali mesmo, para verificar as medidas. O pai ficou de repente muito interessado no comando da televisão, mascando lentamente um fio de palha, os olhos longe do peito decotado não fosse alguma palavra ou interjeição revelar-lhe os pensamentos. A mãe contente e às voltas, apertando a maravilha exposta, apalpando mais do que compondo a camisola, ignorando que nada despe tanto como uma camisola de lã. O filho embaraçado ao ver a sua intimidade assim exposta, estranhando suar tanto só por causa do calor. Rosete manteve-se firme, apenas comentando a feliz escolha das cores. Não resultou. Talvez aquela pressa maternal, inocente mas provocadora, a tenha feito oscilar de tal modo que se manteve depois como que a pairar sobre todos os acontecimentos futuros. Ainda ontem a vi com a camisola vestida, estava linda.
Conheço bem esta história, posso contá-la em conto, sem acrescentar um ponto. É que o filho da mãe, o burro, era eu.
Jammes (burrinho burro).
PC

27 julho 2004

Correio

"tenho um homem fechado na mala da carrinha. digo-te isto silvano porque confio em ti. assim. não sei quem é. nem há quanto tempo lá está. hoje de manhã quando abri a mala para pôr os sacos de compras da minha patroa, vi-o amordaçado, barba por fazer e olhos com covas tão escuras que desconfio que tenham perdido o fundo. não sei se está vivo. tem um corte fino no pescoço, com um fio de sangue seco caído. não me aproximei porque tenho medo dos mortos. mas deixei a mala entreaberta porque tenho ainda mais medo dos vivos. os patrões não deram por nada. já sei que me vão culpar a mim, que é sempre o peixe míudo que paga. digo-te a ti silvano porque me pareces bom tipo. como és guarda nocturno deves ter contactos na polícia como se vê nos filmes. eu não tenho contactos nenhuns. não sei o que vou fazer. se alguem perguntar diz que sou o mário e que estou em apuros."
sent by// Mario
recebido nos comments de A Natureza do Mal

Explicação de Michaux

Muito gostaria eu de saber por que razão sou sempre o cavalo que seguro pelo freio.
Henri Michaux

Foram elas que lembraram isto. E eu gostei e espanta-me que sejam só elas a sentir isso. Chama-se empatia. É uma das mais elementares capacidades animais. Nos humanos parece terem sido as mulheres quem a levou mais longe: perceber os sentimentos do outro, ser capaz de se identificar com ele, acreditar que pode sentir algo de semelhante.Qual a sem razão desta competência ter uma fronteira de espécie? Eu já antes da Rosete era, por vezes, a mulher que me montava.
sent by// Jammes

Um post das Caraíbas

Eu acho que vai ser difícil manter a minha colaboração regular. Aqui em Varadero há Internet. Só tive que pedir autorização ao Ministério da Defesa, passar por uma entrevista com um funcionário dos Serviços de Estrangeiro, enviar os textos para leitura prévia ao Ministério da Agricultura, sector Pecuária . Mas depois em Santiago e Habana vai ser mais difícil. Além disso a Rosete não gosta de me ver a rondar a net. É difícil aguentar um blog no meio de tanta adversidade. Espero a vossa compreensão.
sent by// Jammes

No Parque

À noite fui ao Parque novo. A cidade agora está diferente. Quase só gente do trabalho. Assim achei que podia ir ao Parque sem dar nas vistas. Sem ter medo de ouvir nas costas: Aquele gajo não é o Silvano? O que andou connosco na Quinta das Flores. O chapa da Quinta das Flores? Esse mesmo. Silvano! O que é que fazes, homem? Não te lembras de nós? Respondo sempre da mesma maneira: Faço de tudo. Mas eles percebem logo que eu não faço nada. Sim lembro-me deles. Combinavam jantares às escondidas, trocavam apontamentos, CD's e direcções na net, chamavam-me o chapa. Alguns deles nem devem saber o meu nome.
Mas agora o Parque está um mimo. Há pouca luz e é quase só gente de fora e do trabalho. Também estão uns gajos dos blogs e foi na mesa deles que me sentei. Gostei. Quem falava mais era uma gaja que no mínimo era psiquiatra. Os gajos tinham-lhe respeitinho. Ela repetia as frases menos brilhantes deles com um ar profundo e uma pausa no fim. Se houvesse luz, via-se que aquilo os punha um bocadinho tensos. A certa altura puseram-se a falar de cinema. A gaja deve namorar na Cinemateca ou ser filha do dono de um clube de video. Deu show a falar de filmes que me pareciam ser todos a preto e branco. O máximo foi quando ela se declarou "voyeur", como o Jean Louis Trintignant, no Branco. Todos aplaudiram menos eu. Eu pensava no Esquininha, que é o meu café. Se algum dia eu me atrevesse a dizer lá uma coisa daquelas tinha direito a denúncia à Judite e escuta garantida. O velho tinha razão: Tens que estudar se queres ser voyeur. Fui-me embora mais cedo que eu moro longe, tem outras coisas e a minha mãe não dorme enquanto eu não chegar.

26 julho 2004

Fluexitina, Good-bye

Os gajos disseram-me: Tu escreves à vontade. Mas de vez em quando escreve sobre livros. Não me custa nada. Toda a vida li. E agora que o meu trabalho é este, horas inteiras à espera, a leitura propicia-se. Não tenho a certeza se posso falar de tudo o que leio. Tenho andado a ler os outros blogs. Ninguém fala de alguns dos meus autores favoritos. De forma que vou começar pelos livros que eles me emprestam. Poesia. Um dia li um poema que era assim:

Poema de Amor
Alprazolam, domipramina, noradrenalina,
monoamina, serotonina, fluexitina.

(Pedro Mexia)

Fui ver o significado das palavras. Fluexitina não existe, não é assim. Fluoxetina é que é correcto. Escrevi ao poeta. Nem respondeu. Talvez ainda hoje escreva Fluexitina, diga Fluexitina quando declama a sua obra, julgue estar a tomar Fluexitina. Quando eles souberam não gostaram. Qual é a relevância? Só um estreante é que se importa com pormenores desses. Não te distraias com as árvores. Curte a floresta. Eu gosto das árvores. Decorei este poema. Fiz uma música que canto só para mim, nos turnos mais chatos.
Outro dia esbarrei com outro poema. Dizia o livro que Blanchot o tinha escrito a propósito do suicídio de Rigaut.

Phanodorme, Variane, Rutonal
Hipalene, Acetil, Somnothai,
Neurinase, Voronin, Good Bye.


Telefonei a um dos gajos. Que é esta merda? O Blanchot escreveu mesmo isto? Ele leu o Pedro Mexia? Outra vez os gajos a explicarem que devia moderar o meu espanto, que a questão da precedência não existe na literatura, que os poetas escrevem todos o mesmo poema no tempo sem tempo que é o tempo literário.
Relato este episódio porque foi a minha estreia literária. Quero dizer,o momento em que senti, pela primeira vez, uma impressão não já de leitor mas de crítico. Também decorei o poema a Rigaut. Também o canto. Talvez o prefira ao Poema de Amor. Está mais para o meu feitio, esta maneira de não ligar à morte. E depois, porra, este gajo, o Blanchot, ao menos foi ao Index Terapêutico.

sent by//Silvano

25 julho 2004

Um post

Eu antes de escrever não sabia que havia tantos morcegos. (Isto é um post? Se isto é um post é facílimo escrever um post.)
sent by// Silvano

Os morcegos à chegada

A cidade está deserta debaixo de um calor africano. Só há gente nos hospitais e nos lares de velhos. Parecem estátuas. Daqui a bocado começam a voltar das praias. As crianças febris, as mulheres sem soutien a carregarem as malas térmicas. Os morcegos exultam. De onde vêm tantos morcegos?
sent by//Silvano

Folga

Hoje tive folga. O meu horário agora é MMTNFD. Um luxo. E isto sem sindicato, nem conhecimentos. Depois explico como é que consegui, se não tiver assunto melhor. O Falé, que tem um club radical, pediu-me para fazer de preto. Jantar e vinte euros. Vão gajas? Aceito sempre mas pergunto. Vão gajas? O Falé ri. Sempre podes olhar para o cu das gajas enquanto seguras a corda no rappel. Que me interessa o cu das gajas debaixo dos fatos térmicos. Elas de fato e eu na segurança. Nem me vêm. Sou o gajo da corda. Do saco do lixo. Da mala de primeiros socorros.
sent by//Silvano

Para começar

Comecemos com uma pergunta. Zurbia? Alguém tem zurbia?
sent by//Silvano

Aviso

A menina foi a banhos (enquanto duram os iogurtes). O Bonirre tornou-se Invisível (sozinho à mesa o Bonirre come a metade que sobra do arroz). O burro Jammes foi para Cuba (não, não é a suprema ignomínia. Jammes não é comunista e a Rosete entrou agora na vida dele). O Luís disse-me que não ia escrever por estes dias. Arriscam-se assim a ficar comigo. Eu sou o que fica na cidade quando todos saem. O do turno da noite. O que conserva na parede um poster com a tua cara de gueixa. Comigo isto não vai melhorar. Eu chamo putas às mulheres de quem gosto.
sent by//Silvano

24 julho 2004

Heróis

Também eu tenho os meus heróis blindados. Gosto muito deles. Fico triste e calado se um deles se vai embora de vez. Morre. Hoje foi um desses dias. Não há homenagem capaz de acalmar a minha tristeza, aliás agravam-na por me lembrarem sempre que os podia conhecer melhor, procuro não ver. Hoje não quero conhecer nada de novo do meu herói e regresso, sempre, apenas aos traços que já conhecia. Quando a Rosete chegou já a conversa ía a meio, quase pedia desculpa por aparecer, mas não podia ser de outra maneira porque ela faz parte da minha vida. Caminhou connosco docemente como se tivesse escutado tudo desde o início. Estava muito calor e o meu reflexo nos seus óculos, certamente distorcido pela simetria que ela me dá, agradou-me como um fogo fátuo. Fico parado no tempo se alguém me traz uma revelação espantosa capaz de fazer tremer a imagem de um meu herói. Gosto de acreditar, em quem gosto de acreditar, até ao infinito. Não é um risco desiludir-me. Eu tenho tempo para esperar, também isso sei fazer. Sei que vou voltar a acreditar, em quem gosto de acreditar. Se alguém sofre com a desilusão sou só eu, ninguém me manda ser burro.

Jammes (soa Jáme)

PC

23 julho 2004

Eles

Era mais ou menos assim. Ela mandava-lhe mails para a empresa. Falava sempre de literatura. Quando era Rilke precisava de o ver. Se fosse Stevenson a urgência era desesperada. Javier Marias havia nuvens negras no céu. E por aí adiante que eles amaram-se quase dois anos e os códigos não foram sempre assim lineares. Depois ele tinha de saber onde se encontrariam e outras praticalidades. Podiam falar por TM ou mesmo por fixo ou mandar sms, fax, mms, mensagem de voz, msn, fogos, foguetes, luzes. Mas não, nunca. Falharam quase todos os encontros e foram incrivelmente felizes. Quando ela lhe disse Coetzee ele percebeu que era o fim ou o princípio ou um ataque epiléptico.

Recomendação

A seguir atentamente: O Saca-Mulas Oriental. Gostamos tanto que nem acreditamos ser verdade.

Heróis do Mar

Todos os dias há uma razão de sobra para nos orgulharmos. Pela primeira vez temos uma mulher nas Artes e Espectáculos. Filha de militar. Neta de militar. Não, a oposição não será uma questão de género. Aliás nem estou bem seguro que haja oposição.

22 julho 2004

As portuguesas e os portugueses

Daqui a seis meses Santana já seduziu 50% dos portugueses. Ouvia dizer. E baixinho, pensava: Das portuguesas talvez. A resistência terá então de ser uma questão de género.

Trinta e oito razões

Sampaio tem já trinta e oito grandes razões para dissolver a Assembleia e convocar eleições. A coligação CDS-PP/PSD-PP já mostrou o que pode e sabe fazer. Não são precisas mais evidências. Pare-se o ensaio ou o doente morre.

O homem subterrâneo de Dostoievsky não é nada

O homem subterrâneo de Dostoievsky não é nada: “...nem rancoroso nem bondoso, nem um traste nem um homem de bem, nem um herói nem um insecto.” Raskolnikov já é qualquer coisa. O livro de Coetzee* acaba com Petersburgo a arder. Os fogos são na outra margem, na zona dos estudantes e da Universidade, das caves labirínticas onde uma multidão dantesca tosse, vende o corpo, fede e prepara a Revolução. Quando a Revolução triunfou não foi Raskolnikov quem tomou o poder mas o seu sucedâneo nietzschniano. Ou o Nachaev de O Mestre, pronto a matar, o vingador do povo, mais que niilista, sensualista. Entretanto, no resto da Europa, o homem subterrâneo sofria com êxito a sua mutação e metamorfoseava-se em insecto e como insecto era arrastado para o lixo. Se sobrevivia era alistado nos grandes exércitos que se combateram sem tréguas. Homens sem qualidades ao mando de super-heróis, nas mesas de circunscrição, nas fábricas de armamento, nos batalhões que semearam a ordem nova através da arma poderosa dos seus ancestrais humanos, essa ordem secretamente inscrita no núcleo das suas células e que os mandava violar e eliminar.

A Rússia nachaevista não conseguiu, felizmente, construir o homem novo. Mas conseguiu destruir os que nas caves e nas mansardas da Rússia czarista escreviam como Fiodór Dostoievsky. Da Rússia que vai de Putin ao mecenas do Chelsea vem hoje um enorme silêncio. Ou talvez os herdeiros de Raskolnikov sejam os terroristas da Tchetenia e nós não sejamos capazes de perceber.


*J.M. Coetzee, O Mestre de Petersburgo, D. Quixote

Ir e Vir

Três dias foi o tempo em segundos que contei até totalizar quando a Rosete voltou a aparecer. Deve ter ficado cansada do passeio que demos pela cumeada, ou foram os afazeres do dia que a tomaram. Ela vinha ainda com o mesmo brilho que lhe notei quando levantou a cara de onde a pousou entre as minhas orelhas, a pele amarrotada, os olhos quase estremunhados. Isso dissipou qualquer dúvida que eu ainda tivesse, esquecidas as fotografias com o colega trauliteiro. Ganhei coragem para falar das férias. Tenho ido para a praia por conveniência, as orelhas são muito sensíveis ao sol e por isso estou a perder o pelo. Ela disse que pensava ter visto uma velha ferida de guerra, não ganhei palavras para explicar porque nunca marcharia de farda na praça e que ao invés fui um estivador de carga. A conversa prolongou-se, cotovelo com cotovelo e um após outro os destinos foram riscados por uma razão nunca enunciada. Só poderia ser Cuba, nem quente nem frio, nem seco nem molhado, nem longe nem perto, nem praia nem campo, nem charuto nem danzón, nem brinde nem marisco, nem arquitectónico nem rural natural, por nada disso, pelo abraço longe dos olhares interrogatórios, só lá onde ninguém me vê como sou. Concordámos nisto, olhei para o lado como sempre faço quando muito quero uma coisa que aconteça se tiver de acontecer. E depois de regressar, pensei, podemos voltar. E quanto tempo poderemos nós continuar neste ir e vir de um asno? Toda a vida.

Jammes (ir e vir, ir e vir, ir e vir, zuzurra três vezes).
(três, e pouco mais, palavras finais d'O amor nos tempos de
cólera, G.G. Márquez
)

PC

21 julho 2004

Rosete quando se não espera

Ontem ela veio, a Rosete. Tenho visto que as mulheres vêm geralmente quando as não esperamos. Vêm silenciosas ao fim de tarde. Vêm de manhã, no caminho da venda. Na hora do calor, com o sacho ao ombro. Se queremos que venham não devemos esperar por elas. É uma coisa fácil de fazer, desde que se perceba e tenha tempo. Eu agora tenho tempo para esperar o que não espero. E foi assim que vi chegar a Rosete ao toque distante das vésperas. Trazia uma saia curta, muito curta, de viscose prateado eléctrico. E uma blusa de tiras. Uma tira de tecido, outra da sua pele acetinada. Aproximou-se do muro e disse-me uma palavra sussurrada. Fingi não ouvir, mas não era o meu nome. O meu nome é Jammes, assim me chamam por aqui. Ela chamou-me diabo, mas não posso jurar porque foi só um nome sussurrado. Fui ter com ela. Queria dar um passeio até à cumeada, onde se vê, lá em baixo, longe, o terreiro das festas do Verão. Abaixei-me para ela e a Rosete montou-me à amazona. Era a primeira vez e caminhei devagar, levantando bem as patas, sacudindo-as levemente a cada passo. Não devia mostrar qualquer perturbação. Também isto sei fazer. Ela mexia-se ao sabor da minha ondulação e eu sentia a tensão da viscose e depois a doçura da perna dela ao longo do meu flanco. Cimeiro ao vale parei. Ela segurou o meu pescoço e montou-me à cavaleiro, uma perna para cada lado, com pressão dos joelhos. Fiquei imóvel, todos os corpúsculos que em mim sentem se tinham deslocado para o dorso. Sabia que qualquer coisa iria acontecer e que não devia mexer-me. Então a Rosete debruçou-se sobre o meu pescoço e deitou a face naquele espaço que tenho entre as orelhas. E disse outra vez, muitas vezes, o meu nome.

sent by Jammes
(pequena homenagem a Coetzee de Elisabeth Costello e a F. Dostoievsky, o Mestre de Petersburgo)

Safari fotográfico

A semana passada a Rosete, naqueles repentes que lhe dão, disse-me que ia num safari fotográfico, uma expedição organizada e cronometrada, com jeeps de fora de estrada e mochila às costas. Cada um leva o corpo e várias objectivas, consoante os anos de experiência, o gasto na bolsa e a sensibilidade de quem se esconde atrás da ocular. Ela disse que ia com um colega mas quando disse o nome eu já não estava a ouvir, deve ser um estúpido trauliteiro qualquer, sempre me disseram que devo ser simpático mas não burro. Claro que não estou chateado, desejei-lhe um bom passeio e disse-lhe que o momento do disparo é o melhor, ouvir o estrondo supersónico do espelho que sobe e desce e o folgar da tensão do enquadramento, por um momento sabemos que ficou perfeito. Ele, o outro, há-de saber explicar-lhe isso bem. Mas o que vai ela para lá fazer se até constrói paraquedas de papel para as baratas que encontra no quinto andar? Hibernar é que não vou, recuso-me de teimosia. Há bocadito recebi um sms sos não consigo fotografar, sinto que estou a roubar, é a minha meia hora de brilho sob o buraco do ozono, pensei. Depressa, ainda a tremer de quatro patas abri a net na página do manual do fotógrafo-em-safari, fotografa o que eles vêem, não o que tu vês. Era o cronómetro que estava a mais.

Jammes (num flash de ozono).

PC

20 julho 2004

Nos novos tempos

Nos novos tempos eles usam a língua de madeira dos novos tempos. As nossas palavras têm então de ser claras, mas de uma claridade que cegue os homens da língua de madeira. Temos de ir ao fundo. Caminhar no pântano de cabeça levantada, mesmo vocês oh recolectoras. Depois vem a tundra, onde o terreno é firme e aí encontramos os nossos animais.

Nos novos tempos

Apercebemo-nos que os tempos são outros. Mas eles, o Negrão, os rapazes do Portas, os amigos que o Santana levou com ele, os homens do Negócio que agora dão uma ajudinha ao Comité de Acção instalado no governo, eles já cá estavam há muito tempo. Nós também. Nós fizémos a viagem ao Egipto quando o Egipto era um mundo mais velho do que o nosso e fomos com o rapaz da Macedónia até ao Ganges, ouvimos falar do grande Can, para salvar os nossos filhos contámos todas as noites histórias ao rei, ajudámos Heloísa a ler e isso custou-nos caro na verdade, fizémos algumas das entradas da Enciclopédia, criámos as nações da Europa nas ruínas dos velhos Impérios, conspirámos em todas as esquinas das ditaduras, editámos em impressoras clandestinas palavras, às vezes equivocadas. Mas estamos aqui também há muito tempo. Não somos povo mas somos de granito.

19 julho 2004

Mau Tempo no Canal

Anunciado há algum tempo a Relógio D'Água publicou finalmente uma nova edição do romance de Nemésio. Sessenta anos depois da primeira edição, cuja capa aqui se reproduz e exactamente um ano após Bonirre, o peregrino, ter visto sair do veleiro Acédia uma mulher pálida possuída de emesis incoercível. Essa visão fê-lo esquecer-se da procura da autora de Invisíveis, tornada agráfica. Em contrapartida a descoberta de Margarida valeu-lhe a noite inesquecível na furna do Pico, onde se firmou o pacto inquebrantável entre os pescadores de baleia e a pequena aristocracia das ilhas do Centro. Esta edição é prefaciado por João Miguel Fernandes Jorge e o preço de capa é de 15 Euros.

Orquestra Sinfónica

Também os burros hibernam, de peito gelado, cansaço, desamor, teimosia. No outro dia a Rosete pediu-me o número do telemóvel, este mês lá em baixo na praça há espectáculos ao ar livre, pareceu-nos bem ir até lá. Ela tem-me enviado mensagens SMS, leio-as mas nunca lhe respondo, não tenho forma de lhe dizer que sem o sistema pata-livre não consigo escrever, parece-me que só ela não me vê como eu sou. Assim,também não lhe digo que as recebi, ficam no limbo das telecomunicações mal paradas, mas tenho medo de me trair. Hoje é uma orquestra sinfónica, ela olha para o lado e aponta de onde vem o trombone, eu aproveito a fuga à inspecção dos seus olhos para me deter naquele músculo longilíneo do pescoço que nasce de uma covinha no alto do peito, é forte e forrado de pele macia, chego a ver os poros individuais e a forma como a vida parece entrar e sair por eles rodopiando em espiral para a profundidade quente da pele. Sinto uma tremura, uma brisa providencial ajuda-me a justificar um cisco ou qualquer coisa ondulante no olho que explique o brilho exagerado. Aprendo novos nomes, a violeta, a caixa, o pizzicato, para mim o trombone sempre fora uma flauta baleia.

Jammes (musicalmente Jáaame)

PC

18 julho 2004

Não vale a pena

Se tem o original para que é que quer uma imitação?

17 julho 2004

Posse

Tomada de posse do Governo de Sampaio. Os homens e as mulheres destacados pela plutocracia para esta comissão de serviço alinham-se na Ajuda. Sampaio discursa e declara-se políticamente irresponsável pelo seu Governo. Depois fica sózinho, no canto da coluna. Santana lê um discurso que dizem ter sido escrito por Dias Loureiro mas que mais parecia de Fidel.  O único a não adormecer foi Durão Barroso. Este fala agora num tom de voz  apoteótico. Houvesse povo por perto e teria aplauso certo. Na véspera de se tornar José Manuel Barroso talvez para sempre, está tão feliz, tão speedado, tão em excesso de si próprio, que é a imagem mais impressionante desta tarde de sábado, no Verão.

Falta de espaço para escrever

É difícil fazer um post decente com a cara nos joelhos, na mala de uma Mercedes beige.

O cómodo

Foi isso, precisamente isso, que me disse a Rosete. Não sabia que era um provérbio.
sent by//Jammes

16 julho 2004

A lagarta

Nesse mesmo dia fiz os exames que o homem achou convenientes e saí do consultório com a borboleta e a lagarta, esta já em segundo plano. Na rua senti que olhavam para mim com curiosidade. Quando levava a mão ao olho lá estava, a asa da borboleta  numa agonia. Assim exibindo a minha condição de espasmofílica regressei a casa e ao trabalho.É agora altura de lhe falar no senhor Adalberto. Foi meu marido e é meu patrão. Mantém-se afastado do escritório. Mas é ele quem conhece os mercados e as tendências. Por vezes está na China onde agora tem a fábrica. Fechámos em Constança e deslocalizámo-nos para o sul da China por causa dos custos da mão-de-obra. Vivemos dois anos relativamente bem até ele se convencer que um cliente me dedicava uma simpatia excessiva e de o ter metido na mala do carro e deixado à porta da casa dos meus pais, muito maltratado. Separámo-nos.  Não podia aceitar aquilo nem voltar a olhar os meus pais de frente. Mas nessa altura já dominava o sector de vendas e ele pediu-me para continuar no escritório. Ele é um homem bom para mim e eu acedi, contra a opinião da minha amiga e da minha família. O senhor Adalberto passou a marcar-me à zona. Tornou-se numa espécie de protector. Os rapazes que se interessam por mim desaparecem misteriosamente. É geralmente o meu rosto quem lhe anuncia a minha vida sentimental. Uma ruga na testa, e ele: Quem é? Se lhe digo o nome do rapaz que me alvoroça o coração nunca mais o torno a ver. Uma cor mais desmaiada e logo: Precisa de alguma coisa Cilinha? Se me queixo, lá fico sozinha por uma temporada. Habituei-me a isto e aos espaços de liberdade que as ausências me propiciam. Ao pé da sombra sazonal dele a companhia da lagarta é quase uma bênção.Acompanhe-me só mais uns minutos e verá que faz sentido o que lhe conto e que o faço no seu interesse, sobretudo. Ora não lhe disse que o último médico que consultei,  me disse haver cura para o espasmo do olho. Ele próprio infiltra na pálpebra uma substancia que a paralisa, impedindo assim o tremor. Assim foi que no princípio da semana compareci na Clínica para o tratamento. Alguma coisa deve ter corrido mal, ou é mesmo assim e só nos apercebemos tarde de mais. Saí de lá com o olho negro e a metade direita da face paralisada. Comprei uns óculos enormes. Se me rio o canto da boca permanece caído. Quando me viu  perguntou-me : quem te pôs nesse estado. A voz tremia-lhe de raiva e indignação. E nessa altura, nem sei bem porquê, disse-lhe o seu nome. Não sabia nada de si. Ignorava as suas proezas semi-literárias, o que escreveu de mim e da lagarta. Saiu-me o seu nome e foi o seu nome que ele fixou. Espero que entenda uma situação que eu própria não sei explicar. Não se esqueça. O nome dele é Adalberto. Tem uma carrinha Mercedes beige e às vezes anuncia-se com o nome de família. 
 
set by mail//Cilinha

MAIS AMOR

(mais pirosices, quiçá ao som de “és o 13 do totobola”)

Quiçá calculista ou prudente, não arriscou tudo à primeira - “zurra-me, zurra-me (uma dupla, arrisco)”. Sem resposta, jogou mais segura, impossível falhar - “zurra-me, zurra-me, zurra-me (uma tripla)”. Oh que desacerto, duas mensagens SMS, número oculto, assinatura irreconhecível (Rosete?).

// Recebidas por Jammes/A. Bonirre, desolado

AMOR

(pirosices, um contributo desalinhado da linha editorial)

Só quem ama zurra e dezurra sem desamar e ama e desama sem amuar. Etc.

// Anónima (Rosete?), recolhido por A. Bonirre, incrédulo

Apaixonado

Tenho passado os serões na varanda ou no jardim em frente a casa. Daqui vejo o movimento dos grupos que vão e vêm para a diversão da noite. Acho piada que aqui do cimo parecem-se mesmo com as formigas da montanha, a forma como se repisam as pegadas, e como param brevemente para trocar impressões, contactos e cheiros. Já não sei quando nem porquê comecei a reparar na Rosete. Identifico já os seus rituais habituais, a forma como se veste à noite de modo mais ousado, quase metálico. A graça com que se move e a segurança com que fala com  todos. O oposto de mim, que só a custo me equilibro com uma pata no ar e quando ando se faço rir é por piada e não por graça. Pois é, estou a ficar apaixonado, isto é, acho eu. Todas as imponderabilidades da vida  me têm acontecido, ainda há pouco me ocorreu envelhecer, e agora isto. Temos um grande ouvido, faz parte da nossa natureza, e bem ouço os  risos de escárnio, espanto ou mesmo nojo, e logo pela Rosete, dizem em voz baixa. Mas ela é o meu par espantoso, isto é, acho eu. Às vezes passa aqui mais perto, saudamo-nos e mantemos conversas curtas e de circunstância, sempre tão agradáveis, sabem. Meia hora, meia hora era o que eu precisava para criar qualquer proximidade que abra os nossos segredos. Mas não, meia hora e eu a falar do buraco do ozono, faltam-me as tuas palavras, tu que me corriges as vírgulas, me dás as deixas e as imagens. Meia hora bastava, isto é, acho eu.

Jammes (sussurra apenas Jáme).

PC

15 julho 2004

O movimento é tudo

A Vitorino talvez faltasse estatura. Mas lembremo-nos de Napoleão, José Hermano Saraiva, De Vito e Marques Mendes. Sócrates não tem profundidade, nem espessura, nem autenticidade. O rapaz que aos 16 anos (em 1974!) leu Bernstein e aderiu à JSD porque queria ser social democrata ficou calado quando a dona Judite lhe pediu as suas referências teóricas. Foi um momento muito constrangedor. Os meu amigos gritavam: Não te comprometas, diz Antero! Diz John Stuart Mill. Diz William Morris. Da casa do lado ouvia gritos: Habermas, Rawls, Hanna Arendt, Bobbio. Mas o rapaz que aos 16 anos entrou com Die Voraussetzungen des Sozialismus und die Aufgaben der Sozialdemokratie debaixo do braço na sede da JSD do Fundão tinha uma branca. Dona Judite quis ajudar: diga lá então um homem de acção. E Sócrates aliviado: Mário Soares, sem dúvida.

A lagarta (cont.)

Hesitei em escrever-lhe e nem sei bem porque o faço. Fiquei surpreendida quando uma amiga me disse que a minha lagarta andava nos blogs. Quando fui ler, facilmente cheguei a si. Não gostei. Roubou-me qualquer coisa que não lhe quis dar. E não foi bem a lagarta. Li de novo e percebi que o que escreveu está cheio de falsidades e imprecisões. A minha amiga disse-me que era semi-ficção e que o blog é um lugar semi-privado. Mas esta minha amiga deu ultimamente para me confortar muito, e nem sempre com a verdade. Ainda com a confusão por assentar, decidi escrever-lhe. Envio o mail para a sua empresa, com o seu nome. Ficará tudo assim no domínio semi público.
Começo por dizer como é que o identifiquei. Quando me visitou a última vez, a lagarta estava ainda muito recente em mim. Apesar disso não me queixei. Foi você quem insinuou uma qualquer sombra nos meus olhos. Fê-lo enquanto eu conferia, no computador, a nota de encomenda da sua firma. Respondi-lhe que não era tristeza, era uma lagarta. E você interessou-se. Percebo agora que a sua solicitude é literária. E que, sendo a literatura a maior das mentiras, você tem de estar no centro dos seus relatos. No lugar da lagarta nos meus olhos, ou onde ela se projecta, no meu cérebro. Como sabe, esta última parte não aconteceu. Não me lembro da sua cara com precisão e seria demasiada má fortuna juntar uma cara indefinida a uma lagarta translúcida. Você foi o mínimo que me aconteceu nos últimos seis meses.
Agora, e esta é a parte que talvez lhe interesse do meu relato, vou dizer-lhe o que se passou entretanto. Nestes quase trinta dias que passaram – aproveito para lhe lembrar que termina o prazo de pagamento da encomenda- depois de ir ao primeiro especialista fui a uma segunda opinião. E agora, no princípio desta semana, descontente com a fatalidade da lagarta, resolvi ir a outro. Confirmou que não era retina, que era do vítreo e desinteressou-se completamente do sintoma e do equipamento com que espreitava, para me olhar nos olhos, directamente. Esse afastamento aliviou-me. Sou agora uma veterana em exames do olho e a proximidade do examinador perturba-me. Tenho de me concentrar para não dar um beijo no homem. A minha amiga disse-me que não era perversão, era um impulso daqueles parecidos com os que as mães têm, aquela vertigem de atirar os filhos da varanda abaixo. Quer dizer, coisas que não se realizam e surgem sabe-se lá de onde. Mas voltando ao meu relato. O médico olhava-me nos olhos com ar preocupado, profissional. O que é que se passa, doutor? E ele confirmou que se estava nas tintas para o vítreo, o diagnóstico e o prognóstico estavam bem feitos, qualquer oftalmologista o faria, que estava era preocupado com o que estava a ver. E pegou-me no queixo rodando-me para um espelho. No olho esquerdo, a minha pálpebra inferior, parecia uma asa de borboleta a tremer. Um espanto. Vinte e tal batimentos por segundo, uma competência desconhecida. Primeiro pensei que era a transformação da lagarta. Mas não. A lagarta continuava nos sítios imprecisos do costume. Além dela havia agora, tremulando na minha pálpebra, uma borboleta ou uma asa dela. O médico respondeu às minhas perguntas com um misto de profissionalismo e zombeteria que me desagradou. Que eram espasmos da pálpebra. E a palavra espasmo deve tê-lo inspirado porque me perguntou se eu era espasmofílica. Mas teve medo, ou a coisa não era assim tão científica, porque recuou para uma postura menos interessada e disse-me que tinha que ver o nervo óptico e outras coisas que não percebi na altura.

(continua)

enviado por mail
por Cecília

Lago

Tenho várias donas. Gostam de se chegar ao pé mim e fazer-me festas, eu vou avisando, cuidado não se piquem, não trago posto o creme amaciador dos pelos e tomei hoje banho no lago. Em segredo, aninho-me imóvel, com medo que acabe, e guardo em memória rígida cada gesto da mão. Perscruto as demoras e assusto-me se voltam atrás. Posso ter as orelhas compridas mas aprendi que as mãos não se podem tocar entre si, percebem logo que não são unas. Não sou ingrato, basta-me o pouco que cada uma me dá. Desculpem-me se tento viver mesmo quando não estão a olhar, afinal sou só um burro que não sabe nadar no lago da vida.

Jammes (não sabe nadar)

PC

SEGUNDA PELE

(publicidade)

Ouvi-me, Vós, amigos d’A Natureza, este que aqui ledes, eu, um quase sem abrigo, sem linha editorial, imponderado à deriva ou a trote, cansei-me e zás, fui às compras tratar de mim.
É leve, espaçosa, abotoável a três quartos e a um quarto, tecido anti-mosquito impermeável, Manual de Instruções gratuito e mais uns quantos argumentos dados de barato, não me convenceram. Cedi ao sorriso: isto não é uma camisa de montanheiro, isto é uma autêntica tenda de campismo.Trouxe o tamanho L, pronta a vestir.

André Bonirre

TERCEIRA PELE

(auto-publicidade)

Tamanho L, creme, camisa de caminheiro tipo tenda de campismo, nas melhores lojas da especialidade perto de si ou já na próxima montanha perto de mim.

André Bonirre

14 julho 2004

Adições

Um lugar da incerteza foi um lugar certo para a poesia. No ano passado persegui-a no autocarro tentando ler por cima do ombro o caderno onde escrevia dos poemas mais claros que aqui passavam. Depois desapareceu e voltou a aparecer, com período incerto. Agora, a Rute Mota, abre com Carlos de Oliveira, garantia de bom gosto e tem Um pássaro no lugar do coração.

Pelo olho do girino chegamos ao K2O3, um blog porno-erótico.

O novo ciclo político acordou o melhor dos gatos. Acordar não é bem o termo. Como diz o RAP com o Santana no poder a maior parte dos posts faz-se de olhos fechados.

Um dos nossos pontos de encontro passa ser esta esplanada.

Notícias da lagarta

Agora ela só vê a lagarta de manhã, mal abre os olhos. Quando se debruça no lavatório e faz aquela careta com que avalia as rugas das comissuras, das pálpebras inferiores. E a lagarta flutua preguiçosa no espelho. Quando se senta a tomar o pequeno almoço. E a lagarta ondula sobre a buganvília. Depois, durante o dia, tornou-se tudo mais suportável. Mas ontem, aquele cliente irritou-a tanto que ela franziu os olhos e deixou de ver a sua cara inexpressiva de negociante import-export para só ver o verme insignificante, translúcido, coleante, em movimentos de focagem-desfocagem. E mais que o bicho o seu par espantoso. Eu, como sabem.
Ela telefonou-me. Protestei inocência. Não conheço os dias dela, a infância, a família. Faço uma ideia vaga da prosperidade do seu negócio. Vimo-nos sempre a propósito de transacções, que, para ela, creio terem sido insignificantes. E, desculpe-me a dureza com que lhe vou confessar isto: Não me lembro da cor dos seus olhos. E nem disso me sinto culpado. Simplesmente porque não os levantou nunca frontalmente para mim, mais preocupada com as tabelas que tinha à sua frente do que comigo ou a empresa que eu represento. Como pode ter a certeza que é comigo que cruzou a lagarta? E entusiasmado com a perspectiva que se abria, continuei. Sim, tem a certeza que é a minha cara que vê com a sua lagarta?
Fez-se um longo silêncio do outro lado da linha. E depois ouvi a voz dela, como se tivesse revistado a memória e tivesse saído de lá magoada: é a única cara que recordo nos últimos seis meses.

Desistentes

Não gostámos de ouvir mas são já quatro os cavaleiros do Apocalipse: Durão , Sampaio, Ferro e Vitorino.
Vitorino, comissário europeu e recorde-se, candidato a Presidente da União Europeia, disse cruamente as razões porque renuncia a limpar o PS e conquistar nas urnas o governo de Portugal. Não lhe apetece.
Acontece-me o mesmo, penso ao ouvi-lo. Mas qualquer coisa não bate certo dentro de mim. E é então que percebo que um blog é mais importante que o governo da República. Vamos a isto.

A Manada

Chamam-me burro por vezes. Não consigo evitar uma violenta reacção à frivolidade mas esboço a custo um sorriso de dentes amarelos. Estou destinado a ser um imediato brilhante e de trabalho caudaloso mas sem iniciativa própria. Faz-me muito mal se o de chapéu mais alto me deixa sozinho no leme. Vivo com o lugar de número dois desde que a minha mãe, contra todas as probabilidades, decidiu que eu havia de nascer depois. Estou bem assim. Mas sabem, é o burro, numa manada, que os cavalos seguem.

Jammes (escreva-se só Jáme)

PC

13 julho 2004

Como o melro, não

Cresceu-me a alma de burro, dá-me esta heteronímia, empresta, cede, aluga, qualquer coisa, mas deixa-me passar no meu passo de quatro por entre este jardim. Não ponhas mais nada quando tens de assinar por causa da linha editorial, o meu nome é Jammes. Foste tu que me disseste que podia fazer música a bater com os pés no chão, eu pensava que isso só servia para mostrar ferocidade. Não há razão para te ires embora assim só porque eu escrevo aqui, os outros também se habituaram ao cheiro. Não me importo se às vezes me escondes a palha do almoço. Não engordei, aprendi a guardar uns cubos de açucar nas bochechas, e faço que falo se me apanham a mastigar. Se tens de voar, vai, mas não faças como o melro que me vira sempre as costas antes de levantar voo para longe, vem direito a mim na ascensão ainda que me acertes com o bico entre as orelhas.

Jammes (lê-se Jáme).

PC

Explicação da explicação: onde se diz que sou eu

Pronto, não se discute mais, quem vai (de férias) sou eu.

André Bonirre

12 julho 2004

A linha editorial


Há dias assim. E noites. O rio subiu imperceptivelmente e agora inunda as planícies. O miúdo cresceu e tem que cortar o bigode, esse carimbo iniludível da testosterona em pleno beiço. Como é que foi possível não termos dado conta. E outra vez as palavras da Yourcenar, agora já sem dor, ou talvez a dor seja sempre esta memória de uma dor maior: muito cedo na vida é tarde de mais. Mas já não é muito cedo, e agora são as palavras do último Coetzee: Está quase.
Há dias em que uma luz crua ilumina as coisas. Sabemos o nome antigo das coisas. Outros, noutro lado, intensamente, chamam as coisas por outro nome. E mais uma vez não demos conta. A luz crua ilumina também a merda que és.
Declaração
Assim, ao longo dos tempos, insensivelmente, alterei a linha editorial d A Natureza do Mal. Preocupei-me com a agenda. Com as relevâncias. Não quis chegar atrasado. Adorei heróis que iam morrer. Incorrigível, pendurei retratos.
A Sofia foi ficando cada vez mais deslocada, sem saber o que fazer num blog de actualidades mundanas. O André ficou-se pelos Açores. Mas nos Açores, sabemos desde ontem, resta-nos no prato a metade fria que por hábito cozinhámos. O PC já só de burrico.
Peço-lhes desculpa. Faz parte da natureza do mal não poder manter por muito tempo os disfarces. Esta era a minha semi-vida. Ficarei a olhar os campos inundados, atento ao rapaz já crescido e a como ele nomeia as coisas mais pequenas. Talvez assim recupere a nossa linha editorial.

Ela dançou

No Palácio, ou no Forum (não há bloggers em Aveiro?) ela aproximou-se dos que estavam junto ao palco e aplaudiam de braços erguidos. E com um deles dançou. Enquanto nós cantávamos
Bebe y beben y vuelven a beber
Los peces en el agua por ver al dios nacer
Bebe y beben y vuelven a beber
Los peces en el agua por ver al dios nacer

eles dançavam. Ele merecia ser escolhido. Era forçoso que ela o reconhecesse. Não é todos os dias que se encontra, olhos nos olhos, um admirador assim.

O camião laranja

Seguia eu a trote quando encontrei um camião com uns daqueles letreiros de produtos perigosos, cuidado explosivo. Achei curioso. Na traseira um intrincado complexo de válvulas, tubos, manómetros, a meia carga via-se um contentor cilíndrico aparentando gás de sobre-pressão. Como estava todo tingido de cor-de-laranja, como os laranjas agora, suspeitei que pudesse ser um dos tais camiões transformistas capazes de criar ADM's onde não há nada, ou WMD's como eles dizem, para depois em 45 minutos, noutro sítio qualquer, criar um novo nada. Passei-o rapidamente no meu trote, parei, olhei-o directamente nos olhos, eram grandes, quase tristes, quase amargurados, certamente inofensivo declarei. Fiquei por ali um bocado como que a pastar, batendo os cascos na areia, eles dizem que são muito dissimulados estes WMD, nunca se sabe, e o letreiro público na traseira dizia perigoso, além disso é capaz de haver uma recompensa boa já que ninguém encontrou nenhum.

Jammes (ler Jáme).

sent By//PC

11 julho 2004

A receita de Brzezinski

Sousa Franco, Sofia, Maria de Lourdes Pintasilgo, três mortes em tão pouco tempo. Também Sampaio e Durão morreram de certa maneira. Freitas do Amaral está morto. Aquele que seria uma escolha evidente da República para a sua mais elevada representação é hoje uma hipótese irrealista. Com estes é um mundo que acaba. Teateinment, a receita de Zbigniew Brzezinski nos finais do século 20 está a aplicar-se com uma velocidade insuspeita. Para o Estado dos 20 % verdadeiramente activos poder subsistir sem conflitos insuportáveis é preciso alguma comida e muito entertainment. Um dos nossos melhores entertainers subiu ao poder. Não sei se no fundo não nos devemos congratular.

E agora?

A direita não estava preparada para a cedência de Sampaio. Não falo dos comentaristas. Nem das direcções partidárias. As direcções partidárias vivem num estado de grande confusão. Tendo perdido a sua ligação com a realidade, ouvem do círculo de fiéis em ascensão aquilo que querem ouvir. Falo dos grandes eleitores da direita. Temem a solução Santana. Têm medo do que aí vem. Não sabem se o homem será capaz, se estará preparado. Não se trata de políticas nacionais. Trata-se da questão essencial para os grandes eleitores que é a questão da conservação do poder.
A deserção de Barroso foi inesperada e o que se passou a seguir muito rápido. Para eles era mais confortável a diabolização de Sampaio e a preparação de eleições num clima de queixa e vitimização. Fosse qual fosse o cenário emergente podiam atirar à esquerda e ao Presidente a culpa da desestabilização.
Ontem e hoje vi-os preocupados. E agora? perguntavam.

Juro

Difícil é saber de frente a tua morte
Difícil é ter quarenta anos.
Difícil é saber que o teu amor
representa a morte para o teu amado.
Difícil é quereres partir
e eu sem herança para te dar:
faço-te a mala.
Difícil vai ser fazer arroz
e, no dia seguinte, comer a tua parte
arrefecida.
Difícil vai ser comprar menos pão,
menos ovos,
menos favas.
Palavra que vai ser difícil
e palavra dada é palavra jurada.

(Poema feito a partir do primeiro verso de As Ilhas VII, do livro "Navegações", um dos últimos da Sophia)

Ana Paula Inácio, aqui

10 julho 2004

Maria de Lourdes Pintasilgo

Pena de nós que ficámos sem ti.
Devo-te a campanha das presidenciais. A primeira vez que não votámos por cálculo. Alguém pedia o impossível. O impossível tinha um rosto. E esse rosto, grande medo!, tinha durante três meses governado o país. Vou aos arquivos confirmar: Não nasceram com rabo as crianças amaldiçoadas por cem anos de solidão.

Perguntas do operário leitor

Depois da demissão do Ferro Rodrigues ficou alguém de esquerda na direcção do PS?
Mas se o Sampaio marcava eleições votávamos em quem?
Não será melhor acabar de vez com essa maçada do voto universal?
(A minha opinião oscila entre as opiniões do prof. Freitas do Amaral e as da engª Maria de Lurdes Pintasilgo. Foram os dois ouvidos. Senti-me bem. Não gastem dinheiro em campanhas eleitorais. Se o Santana Lopes não tivesse de ser eleito era populista na mesma, é uma questão 60% genética. Mas gastava menos dinheiro em outdoors e assessores de imprensa)

Conselho de Estado 2004

Vi Jardim à saída. Já servem bebidas ou ele leva pocket-bottles?

Unidade nacional

Parece ser verdade que a independência visita os Chefes do Estado sempre na sua versão perversa. Azar nosso não ter votado Cavaco. A próxima vez que ganharmos umas eleições presidenciais vamos festejar na comemoração dos vencidos.

Sampaio fica na História

No mesmo dia nomeou Santana Lopes primeiro-ministro e demitiu Ferro Rodrigues.

09 julho 2004

A MULHER QUE NÃO QUER SER ENCONTRADA

Alguém se lembra, há um ano, o Luis, magrinho, novinho, mirrado na sua cela, quando citava de cor, sem descanso, a que escreveu os Invisíveis? Lembram-se, ele no isolamento, sem receber qualquer sinal de que era ouvido? Foi então que nasceu André Bonirre, seu maior amigo, que de imediato partiu para o meio do oceano em busca da mulher que não queria ser encontrada.

Nessa procura, André perdeu-se, perdeu-se debaixo do vulcão, perdeu-se por entre as ilhas, perdeu-se numa volta, ao encontrar a mulher magra de cabelos pretos com Margarida a vomitar e isto foi tudo o que André trouxe, perdido, quando regressou.

Mas há uma certeza, Ana Paula Inácio, a mulher invisível, aparecerá um dia, numa de mil folhas, a um sábado, o dia das boas colheitas.

André Bonirre

A lagarta

Ela ia a guiar o jipe por uma estrada do Alentejo a pensar nas encomendas e nos prazos de entrega, quando uma lagarta se lhe colou no vidro. Parou, ligou o limpa brisas, o jacto de água, fechou os olhos com força, uma vez e a seguir. A lagarta vogava agora num território indefinido, já dentro do carro, ou talvez fosse enorme e estivesse no espaço. Uma lagarta translúcida, anelada, suspensa num movimento de progressão. Quando pôde recomeçou a viagem. Trouxe a lagarta até casa. Telefonou a amigos. Foi ao Hospital e o médico disse-lhe que era grave, qualquer coisa da retina que ela não percebeu. Foi a outro médico que se riu do primeiro. Não, afinal era do vítreo e sem remédio.
Por uma qualquer razão quando vê a lagarta lembra-se de mim. Pelo modo como o diz não sei se isso é um elogio ou uma maldição. Mas um par perverso formou-se algures e não sei como desatá-lo.

Lhasa e os outros no TAGV


Ela é uma menina. Um duende numa clareira da floresta. A sua voz é um espelho velado, Alexandre. Ela erra pelas estradas da memória, Juran. Foi ao Líbano, de onde o outro saíu, expulso pelo desamor de um pai. E a Marselha, porto de chegada. Ela canta em castelhano, uma emoção. E em inglês, as histórias do filósofo: Soon this space will be too small. Gosto mesmo quando canta em francês. Já não estamos habituados a ouvir estas coisas: Je me sens coupable /Parce que j’ai l’habitude/ Je garderais/ Pour me guider/ Plaisir et culpabilité. E quando convocou todos os que se sentiam culpados para cantar o refrão foi consolador ouvir o TAGV em coro. Também não espantava. Estavam lá todos os da manif. do sms no Governo Civil. Mesmo os que tinham faltado no Governo Civil. Até a rapariga loura do acaso da rua lá estava. E ela, a Lhasa: Sur la marée haute/je suis montée/ La tête est pleine/ mais le coeur n’a/ pas assez. Era assim que nos devíamos sentir sempre. É por isso este post(umo).
Sim, Luís, obrigado. A mãe estava lá.

08 julho 2004

O silêncio nunca é o mínimo que dizemos

A Natureza do Mal desfeita pelos seus leitores

Olá. Deves ter cuidado quando falas assim da biologia. As pessoas em geral não gostam de pensar os fundamentos biológicos. Piora em temas quentes como o sexo/género, é impensável apontar diferenças, deixa isso para uma boa conversa com o outro à tua frente, bem explicadinho. Não nos fales das nossas mais baixas origens.
Bettencourt


Ele ontem veio ter comigo e é pelos olhos tristes que te escrevo. O pai dele não era um pai a brincar, um pai de blog e a tua avó uma mulher cheia de ternura. Só perguntava porquê, em nome de quê inventas tu uma família assim.
T.

Viva. Tá-me a parecer que tu é que precisas de Educação Sentimental. Tem cuidado quando falas de amor. Eu percebo que falas para mim e encontro na Tasca o consolo que preciso. Mas pode não ser assim com toda a gente.
J.

Recuso-me a ler um blog escrito por um burrinho.
Ana B.

Se queres seduzir todas as mulheres é lá contigo. Mas não lhes chames feias.
Linch

Gostava mais de ti preso.

Armanda

Atenção. Quando escrever sobre política pense que as fontes podem não ser confiáveis. Aliás porque escreve sobre política?
Henry

Há muito tempo que o Luís deu lugar ao Mr. Hide.
Joana

Hoje no TAGV em Coimbra


Lhasa de Sela
com

Mélanie Auclair (violoncelo)
Alex McMahon (pianos acusticos e Fender Rhodes)
Rick Hayworth (guitarra)
Mario Légaré (baixo)
François Lalonde (bateria, percussões)

07 julho 2004

Sophia por ALC na Antena 2

Uma evocação de Sophia foi feita ontem, na Antena 2, por Alexandra Lucas Coelho. Peçam à direcção da RDP para repetir numa hora menos confidencial.Usem o mail antena2@rdp.pt

Algumas explicações para a derrota

Elas trouxeram para os relvados, os jardins, as praças públicas, os estádios e as praias aquilo em que são especialistas: a emoção , a subtileza, a cor, a fé, a delicadeza, a elegância. Mas havia no seu apoio uma enorme ambiguidade que enfraqueceu o apoio unanimista e como o verme na rosa, adoeceu a equipa na hora em que devia ser vencedora. Quem estivesse atento teria compreendido. A maioria não percebe as regras do fora de jogo. Suspeito que nem sequer as regras do jogo. Preferem as transmissões televisivas ao espectáculo ao vivo. Por causa dos grandes planos, sobretudo. Comentam os cortes de cabelo, os brincos, as olheiras. Não dizem alto, mas adoram as lesões, quando os rapazes ficam imobilizados pela dor e os massagistas e médicos lhes levantam os calções para pôr o spray ou o bálsamo. O guarda redes adversário lembra-lhes logo o Clooney Mas Mais alto. O médio Zagorakis é o De Niro Quando Novo. O pior é quando confundem toda a equipa grega com a Academia e a opinião se suspende. J., interno de uma especialidade médica, foi ver um jogo a casa de umas colegas. Eram dez mulheres e ele. O lanche foi indescritível. Elas tinham preparado preciosidades (J. é espanhol como já pereceberam). Ele sentiu-se do outro lado do espelho: a bola rolava entre Prada, DG e as compras da Victoria em Paris. Houve um momento especial: um grego derrubara o Deco destruindo uma ofensiva e fez-se silêncio em lugar de protesto ruidoso. Estavam a pensar se levavam o grego a jantar. J. tornou-se num adepto discreto das quotas.

Tontamente

Rosa Montero (El Pais) escreve ontem que ao ler biografias, um género favorito, fica sempre inquieta com a frase:"essa foi a época mais feliz da sua vida". A época mais feliz, e o biografado não sabia. Quizá vivió aquel tiempo glorioso tontamente, diz ela. O Verão de 2003 foi o Verão dos blogs no ar. Sim, tinha havido a guerra e as janelas não se encheram de bandeiras como em Espanha e na Itália. Sim, metade do país ardia. Mas apesar de tudo, tontamente, sabíamos, alguns de nós sabiam, que essa era uma das épocas mais felizes das nossas vida. Estão quase todos a fazer anos, já fizeram, nós não nos esquecemos.

06 julho 2004

Canto Jondo

Numa noite sem lua o meu amor morreu
Homens sem nome levaram pela rua
Um corpo nu e morto que era o meu.

Sophia de Mello Breyner Andresen
Mar Novo

O Hospital e a Praia

E eu caminhei no Hospital
Onde o branco é desolado e sujo
Onde o branco é a cor que fica quando não há cor
E onde a luz é cinza

E eu caminhei nas praias e nos campos
O azul do mar e o roxo da distância
Enrolei-os em redor do meu pescoço
Caminhei na praia quase livre como um deus

Não perguntei por ti à pedra meu Senhor
Nem me lembrei de ti bebendo o vento
O vento era vento e a pedra pedra
E isso inteiramente me bastava

E nos espaços da manhã marinha
Quase livre como um deus eu caminhava

Porém no hospital eu vi o rosto
Que não é pinheiral nem é rochedo
E vi a luz como cinza na parede
E vi a dor absurda e desmedida

Sophia de Mello Breyner Andresen
Livro Sexto

Ele volta

Vi José Barroso zangado. Ele só aceitou o alto cargo europeu de que nos devemos orgulhar depois de se certificar que o consórcio R. aceitava PSL e o Presidente da República não convocava eleições. Ora não se verificando a segunda premissa ele ficou zangado. E só não digo que ficou zangado e feio porque a estética não deve influenciar os julgamentos políticos. E porque de facto não o acho feio. Mas estava zangado e ameaçou: se o PR convocar eleições desiste da sua candidatura europeia e volta. Dito isto tenho de declarar algumas coisas: gosto das mulheres em Robe-Trench, em organza pele, em crepe viscose, de busto relifié, em mousseline crepon, linho branco, setim, jersey de seda, tule, galuchat perfurado, cardigans longos, jacquards.

Flores para a Manela (corr.)

O post que intitulei Flores para a Manela não era apenas de mau gosto - houve quem lesse que eu achava a Manela feia e que isso, ser feio ou feia, seria uma categoria política. Sobre isto ainda vou escrever hoje. Sucede que o post não foi falhado apenas por se prestar a interpretações tão afastadas das intenções. A própria informação que eu comentava, a auto-crítica da Manela na Comissão Nacional, não seria verdadeira, antes um produto da contra-informação do aparelho santanista (ver Barnabé, Abrupto). Que voltem a florir as flores para a Manela. A partir de agora terei cuidado redobrado com as fontes.

05 julho 2004

A disfunção

A disfunção

Se diz que há na cabeça dos poetas um parafuso a menos
Sendo que o mais justo seria o de ter um parafuso trocado
do que a menos.
A troca de parafusos provoca nos poetas uma certa
disfunção lírica.
Nomearei abaixo 7 sintomas dessa disfunção lírica.
I - Aceitação da inércia para dar movimento às palavras.
2 - Vocação para explorar os mistérios irracionais.
3 - Percepção de contigüidades anômalas entre
verbos e substantivos.
4 - Gostar de fazer casamentos incestuosos entre
>palavras.
5 - Amor por seres desimportantes tanto como pelas
coisas desimportantes.
6 - Mania de dar formato de canto às asperezas de
uma pedra.
7 - Mania de comparecer aos próprios desencontros.
Essas disfunções líricas acabam por dar mais importância
aos passarinhos do que aos senadores.

Manuel de Barros

sent by// R. a propósito do post Flores para a Manela, e mais que o post a troca de comentários que se seguiu e deixou o postador arrasado.

2004

O ano em que não ganhámos o Europeu de futebol.

04 julho 2004

Visto de Saturno

Perdemos. Eles jogaram melhor e ganharam-nos. Por duas vezes. A quantidade de felicidade que hoje vai na Grécia é semelhante às lágrimas que escondemos.

Filomena

Há vinte anos a mãe meteu-a num comboio para a grande cidade. Era uma adolescente e ia servir. Desse tempo guarda umas cicatrizes equívocas nos braços e uma imagem da senhora de Fátima. Há oito dias, entre duas grandes penalidades, deu por si de joelhos a fazer um pedido. Hoje acordou cedo para cumprir a promessa, duas velas em Fátima. Voltou à cidade onde agora trabalha, equipou-se a rigor para ver o jogo, e festejar, seja qual for o resultado, porque ela acha que tem razões de sobra para o fazer.

François Truffaut

A Taschen publicou um volume dedicado à filmografia de Truffaut. Ocasião para rever o puto de 400 coups a crescer, de aprender a roubar beijos, de tremer com a chegada da mulher do lado, de piscar o olho para o homem que gostava de mulheres (com cuidado), de correr para chegar a tempo ao último Metro. Em Setembro sai a edição em português.

Eloy Sánchez Rosillo

"Cuando crezca mi hijo, qué haré yo sin el don de la infancia?"

Sem flash back

Não tive tempo para ver em directo. Mas o Flash back de ontem (meia-noite na Sic Notícias) foi elucidativo. Recomendo vivamente a quem queira perceber a crise política. JPP pacificado, solitário, lúcido. A leveza do ser que se reencontra consigo próprio. José Magalhães não queria falar e adormeceu a audiência. O PS, o PMV-nue não tem liderança, não tem pensamento político alternativo, não tem linha de rumo, não tem estratégia. Ouve gritar Eleições! e repete. Mas não sabe porquê. Como os velhinhos demenciados nas casas de repouso a gritar Golo ao clamor das ruas.
O drama deste país não é a direita. A direita é a forma natural da plutocracia governar e Durão Barroso ou PSL são muito melhores que os senhoritos do Antigo Regime. O problema deste país é a esquerda.

A rua a levantar-se

Jorge Silva Melo escreve sobre a manif de domingo passado, em Belém, a primeira convocada por sms. Éramos muitos e não nos reconhecemos. Cruzámos os olhos e não nos reconhecemos. Sabia que alguns de vocês estavam lá e gritei, mais para que não se sentissem sózinhos do que na esperança que o presidente ouvisse. Não sabia que Montaigne, cheio de confiança, estava entre nós.

Escrito no Sistema Solar

Talvez se tenha enganado na convocatória e achou-se em frente de uma pessoa que lhe falava da Divisão de Cassini, de como, sete anos depois de sair da Terra, a sonda tinha passado entre os anéis F e G de Saturno e fotografado com uma resolução de 150 metros por pixel. Pediu algumas das fotos para fundamentar a sua decisão. Uns dias antes fora surpreendido por um acessor a ler o Abrupto, A Praia, o Barnabé, a Loja, sei lá. Hoje ainda, demorou-se nos poemas de Sofia que, justiça lhe seja feita, sabia de cor. Segunda feira de manhã, quando apresentar a sua demissão, José Manuel Barroso vai ter uma surpresa.

Conversa de Mulheres

Não sei se esta conversa se esgotou ou não. Faço votos para que continue, aqui, e em outros palcos.

03 julho 2004

Daniel C. Dennett em Lisboa

O MilFolhas de hoje dá a notícia. Daniel C. Dennett estará em Lisboa no final da próxima semana e dará duas conferências. Dennett é autor de Brainstorms, Brainchildren, Elbow Room, Consciência Explicada, A Idéia Perigosa de Darwin e Freedom Evolves (2003). É o director do Centro de Estudos Cognitivos da Tufts University e vive em North Andover no Massachusetts. O Sunday Times classificou-o como o Leonardo do Novo Renascimento. Freedom Evolves é uma reflexão sobre o determinismo e o livre arbítrio a partir da teoria da evolução, das neurociências, da Inteligência Artificial. A Filosofia dos nossos dias e um dos seus mais brilhantes intérpretes, o homem das barbas brancas, num Anfiteatro perto de nós. A não faltar, absolutamente.

8 de Julho, às 15h00,"Philosophers, Zombies, and Feelings: The illusions of 'first-person' approaches to consciousness" no Anfiteatro 14 da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
9 de Julho, às 15h00, "Rational Avoidance in a Deterministic World", no Anfiteatro da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa.
A entrada é livre.

Flores para a Manela

Ela entrou e saiu sozinha sem prestar declarações para o povo que aquilo era uma reunião da família. Lá dentro pediu desculpa por ter reagido a quente e falado em golpe de estado. Soube do Santana pelos jornais. Se lhe tivessem dito alguma coisa antes. Não tem nada contra ele. Sempre era melhor um Congresso, mas se não puder ser. E já agora, tomem lá um brinde, a minha cabeça numa bandeja: já tinha sugerido ao primeiro a sua substituição. E para acabar: Que ninguém duvide do meu amor ao partido. Os plutocratas unidos rebentaram numa ovação.
Murcharam assim depressa as flores que um dia tinham florido a medo. Vimos que te tinham enviado e trememos. O que vai ela fazer às flores? Mas há um momento de grandeza em cada um de nós e até uma plutocrata pode por vezes juntar-se à correnteza. Não foste capaz. Viste os 99,9% e foste declarar-lhes o teu amor ao Partido. Amor àquela merda cuja razão de ser é tomar o poder e conservá-lo, distribuindo as benesses pelos plutocratas, onde quer que eles estejam. Amor aos líderes distritais e concelhios, essa escória cuja glória é sentar-se duas vezes ao ano ao lado dos barões nacionais. Amor aos que fazem, escondem, legitimam o negócio imundo.
Passaremos a olhar para ti como para uma pobre mulher, de carteira e sem tempo para o seu corpo, que ama o Partido. Duram tão pouco tempo as flores nas jarras das mulheres a quem só resta o amor do Partido.

Sophia

Vi as águas, os cabos, vi as ilhas
E o longo baloiçar dos coqueirais
Vi lagunas azuis como safiras
Rápidas aves furtivos animais
Vi prodígios espantos maravilhas
Vi homens nus bailando nos areais
E ouvi o fundo som de suas falas
Que já nenhum de nós entendeu mais
Vi ferros e vi setas e vi lanças
Oiro também à flor das ondas finas
E o diverso fulgor de outros metais
Vi pérolas e conchas e corais
Desertos fonte trémulas campinas
Vi o rosto de Eurydice das neblinas
Vi o frescor das coisas naturais
Só do Preste João não vi sinais

As ordens que levava não cumpri
E assim contando tudo quanto vi
Não sei se tudo errei ou descobri


Navegações VII, p. 65

Brando (1924-2004)


Dizem os antropólogos que não nos é dada a graça do sexo casual. Tu pelo menos tentaste. Tapaste-lhe a boca quando ela te quis dizer o nome. Maybe we can come without touching, disse a Maria Schneider. Tu pensaste que ela estava a falar demais.

Sophia de Mello Breyner Andresen

Biografia

Tive amigos que morriam, amigos que partiam
Outros quebravam o seu rosto contra o tempo.
Odiei o que era fácil
Procurei-te na luz, no mar, no vento.

"No Tempo Dividido e Mar Novo",

02 julho 2004

Pastore Pavón, 1922

Estrella Morente é uma das filhas de Enrique, o animador da Factoria de Ideas Morente y Familia. Brilharam em Granada com a evocação da Niña de los Peines, um espectáculo de flamenco e Lorca. Tenho pena que não possam ver a foto de Sole Miranda que acompanha a notícia de El Pais (não se pode mesmo fazer nada, João, desde Lleida?). Estrella veste Loewe, esta muy flaca pero pletórica de talentos.

Stranger Shores

A gora em Paperback na Penguin. L iteratura. E vinte e seis ensaios de J.M.Coetzee. Kafka, Musil, Defoe, Cees Noteboom, Brodsky, Rushdie, Borges e outros. Rilke também, claro. Um clássico é aquilo que sobrevive. E nós com eles. C om as palavras deles.

JPP

Zazie, parabéns. Ontem o JPP (infelizmente o Público não tem o texto on-line) disse o que outros calaram. A unanimidade do CC do PMV-npe (Partido Mais Votado nas penúltimas eleições) foi comovedora. O silêncio dos plutocratas, eloquente. Só me lembro de uma coisa pior. O aspecto da direcção do PMV-nue(Partido Mais Votado nas últimas eleições) na reunião do seu CC, na véspera, noutro hotel, na mesma capital.

Vergonha

Lê-se aqui, a uma coluna, num canto de uma página envergonhada. Ela tinha 26 anos e três filhos. Ele ameaçava-os com maus tratos e facas. O mais velho, de cinco anos, estava à porta do quarto e assistiu ao assassinato. O STJ veio reduzir a pena do assassino porque descobriu uma atenuante. Ela recusava-se a ter sexo com o homem que a viria a matar. O acórdão está escrito com um tom repelente que pretende ser humorístico. O juiz do STM que assina a prosa chama-se Pereira Madeira. É um homem perigoso. Lamento viver num país que tem leis destas e um STJ assim.

Luís Januário

01 julho 2004

Chico Buarque


Moças entravam e saíam de minha vida e meu livro se dispersava por aí, cada capítulo a voar para um lado. Foi quando apareceu aquela que se deitou em minha cama e me ensinou a escrever de trás para diante. Zelosa dos meus escritos só ela os sabia ler, mirando-se no espelho, e de noite apagava o que de dia fora escrito, para que eu jamais cessasse de escrever meu livro nela.

Budapeste, Romance, Companhia das Letras, 2003; D. Quixote, 2004

CINDERELAS


“Quem nunca perdeu alguém? Quem nunca sonhou com um príncipe encantado?
Quem nunca teve de correr para chegar a algum lado?
Queres ser Cinderela?
O sapatinho da Cinderela não nos serve.”

A PRENSA- Grupo de Teatro e Afins continua viva!
Amanhã, 6ª feira, estreia mais um projecto, "Cinderela". É às 22 horas, na Loja Consigo (ao lado do Jardim da Sereia).

Vamos a correr, provar um sapatinho.

André Bonirre

E tudo se acabou domingo à tarde

Na segunda feira limpem os cacos, comecem a apagar os fogos, varram as cinzas, contem os mortos da onda de calor (vejam debaixo do tapete, no armário, eles escondem os mortos,não esquecer). Na segunda feira o Aguadeiro vai coordenar o Plano de Contingência Para Ondas de Calor 2004, substituindo o Director Geral que vai para Secretário de Estado. O Secretário de Estado vai para Ministro por causa da estabilidade. O Ministro vai para o Conselho de Administração. O jornalista para o Gabinete de Imprensa por causa da serenidade. Também por causa da serenidade vai para a rua o outro jornalista.

sent by Jammes (ler Jáme)