HOSPITAL DE PONTA
André Bonirre


Comprei por causa do auricular. É pequenino e quase imperceptível. Tecnologia sem fios (extra). Além disso não se chama walkman, eu não quero aquilo para andar. Também não quero armazenar nada. Nem reprodução fiel. A voz de Rafael Alberti não foi digitalizada. Quero passar despercebido no balcão, às cinco da tarde de quinta feira, uma semana sim uma semana não. Já tinha treinado o vagar dos gestos e a cara que entrego ao atendimento público. Só me faltava uma prótese destas, que não sobressaísse do canal auditivo externo para o pavilhão. A Sandra sabe, o chefe e os utentes não precisam de saber. O mais pequeno dos instrumentos ao serviço de uma emoção sem nome.
Nas ilhas Chatham, a 800 quilómetros para leste da Nova Zelândia, séculos de independência do povo moriori terminaram brutalmente em Dezembro de 1835. A 19 de Novembro desse ano chegou um barco que transportava 500 maoris equipados com armas de fogo, cacetes e machados, seguido a 5 de Dezembro por mais 400 maoris. Grupos de maoris começaram a andar pelas povoações morioris, anunciando que os morioris eram agora seus escravos e matando os que se opunham. Uma resistência organizada por parte dos morioris podia, nessa altura, ter derrotado os maoris que estavam em desvantagem numérica de um para dois. Contudo os morioris tinham uma tradição de resolver as disputas pacíficamente. Decidiram numa reunião do conselho não ripostar, mas propor a paz, a amizade e uma partilha de recursos.
Si el atentado de Madrid fuera obra de Al Qaeda, los ciudadanos, quizás, tardaríamos mucho en asimilar esa información porque todo el mundo se siente más seguro pensando que se ha tratado del zarpazo de despedida de una organización, ETA, que está en sus últimas, por muy terrible que haya sido el golpe, que creyendo que se trata de la tarjeta de visita, y de presentación, de una organización nueva, potente e muy cruel, que augura una nueva era de pesadillas. Incluso ha dado la impressión de que esta era la actitud del gobierno y que se resistia a aceptar la idea de que España podia enfrentar-se ahora, ademas de a ETA, a otra organización terrorista todavia más infame y mucho más secreta.
A Cristina não é quem eu pensava. Fartou-se do Escrivão Bartleby e quer matá-lo. O Escrivão é um homem de quem as pessoas fácilmente se fartam. Conheci-o no Dead Letters Office, em Washington, antes de arranjar emprego na Janela. Por comiseração a Cristina propôe que seja entregue à justiça e A Natureza do Mal a sua prisão.
Nunca soube o teu nome. Entraste numa tarde,
Em 2001 foi um dos meus livros preferidos. Se teve algum êxito de vendas julgo ter contribuido modestamente. Acho que todos os meus amigos o leram. Na noite em que André Bonirre encheu a casa amarela e me sentei num canto a ler, O Canto do Vento nos Ciprestes era um dos livros da bagagem. Li em surdina
Eu dissera a Rosa Montero que o passeio começava na Portela do Homem. Chegámos tarde, por problemas técnicos, e o percurso iniciou-se, de facto, em Leonte. Subimos ao Vidual e depois à Portela do Vidual e voltámos para Norte ao longo da Lomba-de-Pau. Depois avistámos os dois Prados do Conho, onde a moreia se adoça. Ocupado com o caos de blocos rosados que caíam atá o circo fui o último a chegar. Os meus amigos ocupavam uma mesa de pedra improvisada e repartiam as comidas. O André Bonirre, comedor insaciável, estava uns metros acima, sentado como um camponês, a comer a carne que as meninas, nas vésperas, tinham amorosamente assado. Ficámos a ouvir as gargalhadas do grupo, exageradas pela excitação das alturas e do cansaço dos corpos. Depois andámos pelos charcos de altitude até ao Prado da Messe, o maior dos prados do Gerês, onde el-rei D. Carlos caçou e edificou uma construção precária. Descemos a Costa da Saborosa até ao destino, a Albergaria. Era o fim do dia e o céu abriu-se naquela cor tranquila. E vimos as torres de granito, os inselberge, as medas e os borrageiros, os caprichosos tor. Acabámos de noite, fraccionados, segundo as afinidades e a qualidade das botas.
Não é apenas um filme muito lindo entre um homem perdido e uma mulher esquecida. É uma história de amor intergeracional. Sabe-se que histórias destas acabam em punições exemplares (cf. Disgrace de Coetzee). Aqui a história é verosímil porque 1. Tóquio é um ponto de passagem 2. Tóquio é o estrangeiro onde quase ninguém fala a nossa língua 3. o jet-lag opera uma diminuição da consciência e da vontade 4. a rapariga confronta-se com o erro da sua escolha natural-aquele fotógrafo ressonador meio-anormal 5. o homem percebe que a cor do sobrado do escritório, a bem dizer, não lhe interessa 6. o beijo em que se encontram é simultâneamente o beijo de despedida.
Há pouco na TSF: Mário Nunes, na qualidade de presidente da Comissão de Toponímia da Câmara de Coimbra recusou a proposta de Aristides Sousa Mendes para uma rua da cidade. Os argumentos terão sido: 1º) Não há de momento rua, beco, viela, travessa, largo ou praça disponível.(Haverá em breve uma Avenida junto ao novo Estádio mas, com naturalidade, receberá o topónimo do mais recente benemérito coimbrão, o senhor Américo Amorim). Esta justificação constitui, só por si uma limitante absoluta, mas o presidente quis-lhe juntar uma outra:2) "Aristides Sousa Mendes foi só mais um estudante que passou por Coimbra".
Um estudio em Londres, uma tela, uma cadeira e um homem sentado na cadeira. Esse homem é um escritor, um crítico de arte ou um dealer. Segura o disparador de uma máquina fotográfica que pode accionar quando quiser. À sua frente (à nossa frente), virada para ele (de costas para nós), está uma mulher. A mulher é alta, sofisticada, veste roupa desportiva e sapatos altos. A mulher é a anfitriã, a dona do estúdio, a criadora do cenário e das regras do jogo. Talvez atrás da máquina exista um espelho. Certamente que existe um espelho, através do qual o homem sentado na cadeira se vê, e vê o outro lado do corpo da mulher.